Economia

Nova política industrial prevê linhas de crédito, uso de compras governamentais e conteúdo local em seis “missões”

A nova política industrial, que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) lançará nesta segunda-feira (22) em uma solenidade no Palácio do Planalto, retoma o papel do poder público como indutor do desenvolvimento da indústria, com o uso de linhas de crédito, subsídios e requisitos de conteúdo local para fomentar empresas nacionais —iniciativas polêmicas e que foram alvo de críticas em gestões passadas do PT.

O plano, que estabelece uma série de metas até 2033 para a “neoindustrialização” do país, foi batizado como ‘Nova Indústria Brasil’ e será apresentado como um programa com o objetivo “reverter o processo de desindustrialização precoce e severa que acomete o país há décadas”, conforme documento ao qual a CNN teve acesso. O programa foi noticiado inicialmente pelo jornal “Folha de S. Paulo”.

Ele está dividido em seis “missões”, termo difundido pela economista ítalo-britânica Mariana Mazzucato, professora da University College London (UCL) e com forte ascendência no debate sobre políticas industriais.

A expressão já vinha sendo usada pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Industrial (CNDI), coordenado pelo vice-presidente Geraldo Alckmin, que publicará uma resolução na segunda-feira com as diretrizes do programa e suas metas.

“Por meio da neoindustrialização, busca-se a retomada do parque industrial em novas bases contemporâneas: sustentáveis, digitais, inclusivas, lideradas por inovações tecnológicas e vocacionada para o comércio exterior”, afirma o documento.

As seis missões são:

• Cadeias agroindustriais sustentáveis e digitais para a segurança alimentar, nutricional e energética;

• Complexo econômico industrial da saúde resiliente para reduzir as vulnerabilidades do SUS e ampliar o acesso à saúde;

• Infraestrutura, saneamento, moradia e mobilidade sustentáveis para a integração produtiva e o bem-estar nas cidades;

• Transformação Digital da indústria para ampliar a produtividade;

• Bioeconomia, descarbonização e transição e segurança energéticas para garantir os recursos para as gerações futuras;

• Tecnologias de interesse para a soberania e defesa nacionais.

Há um roteiro de iniciativas para cada uma das missões, que contemplam medidas como linhas de financiamento, redução do tempo de análise de pedidos de patentes, racionalização de taxas portuárias e de procedimentos aduaneiros, estímulos à inovação e à pesquisa.

A resolução do CNDI define 13 “instrumentos financeiros e não financeiros” para dar suporte ao Nova Indústria Brasil: compras governamentais, empréstimos, subvenções, investimento público, créditos tributários, comércio exterior, transferência de tecnologia, propriedade intelectual, infraestrutura da qualidade, participação acionária, regulação, encomendas tecnológicas e requisitos de conteúdo local.

No documento de 83 páginas que apresenta o programa, alguns mecanismos são citados diversas vezes, como o uso das compras governamentais para incentivar setores da indústria e regras de conteúdo local que devem ser aplicadas nas obras no Novo PAC, o plano de infraestrutura do governo.

Uma parte significativa dessas ações chegou a ser usada em governos anteriores do próprio Lula e da ex-presidente Dilma Rousseff (PT), mas foi reduzida ou extinta nas gestões Michel Temer (MDB) e Jair Bolsonaro (PL), como exigências de maior conteúdo local na Petrobras e margem de preferência para produtos nacionais em licitações públicas.

Esse último ponto, inclusive, esteve no centro das discussões para o acordo de livre comércio entre Mercosul e União Europeia. Lula vinha reclamando das dificuldades que o acordo, fechado no governo Bolsonaro (mas jamais assinado), impunha para o uso das compras governamentais como mecanismo de fomento à indústria nacional.

A resolução do CNDI estabelece “metas aspiracionais para 2033, quantificáveis e embasadas em dados, [que] foram definidas para cada uma das missões e são de responsabilidade de toda a sociedade brasileira”. São as seguintes:

• Da missão cadeias agroindustriais sustentáveis e digitais para a segurança alimentar, nutricional e energética: aumentar a participação do setor agroindustrial no PIB agropecuário para 50% e alcançar 70% de mecanização dos estabelecimentos de agricultura familiar, com o suprimento de pelo menos 95% do mercado por máquinas e equipamentos de produção nacional, garantindo a sustentabilidade ambiental;

• Da missão complexo econômico industrial da saúde resiliente para reduzir as vulnerabilidades do SUS e ampliar o acesso à saúde: produzir, no país, 70% das necessidades nacionais em medicamentos, vacinas, equipamentos e dispositivos médicos, materiais e outros insumos e tecnologias em saúde;

• Da missão infraestrutura, saneamento, moradia e mobilidade sustentáveis para a integração produtiva e o bem-estar nas cidades: reduzir o tempo de deslocamento de casa para o trabalho em 20%, aumentando em 25 pontos percentuais o adensamento produtivo na cadeia de transporte público sustentável;

• Da missão transformação digital da indústria para ampliar a produtividade: transformar digitalmente 90% das empresas industriais brasileiras, assegurando que a participação da produção nacional triplique nos segmentos de novas tecnologias;

• Da missão biooeconomia, descarbonização, e transição e segurança energéticas para garantir os recursos para as futuras gerações: promover a indústria verde reduzindo em 30% a emissão de CO2 por valor adicionado do PIB da indústria, ampliando em 50% a participação dos biocombustíveis na matriz energética de transportes, e aumentando o uso tecnológico e sustentável da biodiversidade pela indústria em 1% ao ano;

• Da missão tecnologias de interesse para a soberania e a defesa nacionais: obter autonomia na produção de 50% das tecnologias críticas para a defesa.

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