Fomento

FIDCs e investidores pessoa física

Conversamos sobre FIDCs (Fundos de Investimento em Direitos Creditórios) com Thiago Figueiredo, diretor de investimentos do Intrabank. Essa conversa leva em consideração, principalmente, a ótica de investidores pessoa física, que poderão aplicar nesse tipo de produto a partir do próximo dia 2 de outubro.

No que investe um FIDC?

Para responder essa pergunta, vou explicar como funciona o nosso FIDC, que nós chamamos de multi sacado (empresas compradoras) e multi cedente (empresas vendedoras). Nós emprestamos para qualquer tipo de setor, seja industrial, agro ou serviço, sendo que já fizemos mais de R$ 4 bilhões em operações de direito creditório, e somos muito focados em middle e light corporate, empresas de R$ 100 milhões a R$ 3 bilhões.

Um direito creditório nada mais é que um crédito que uma empresa possui, gerado pela venda de um produto. Vamos considerar que a venda foi feita para um grande comprador que pede dos seus fornecedores 180 dias para efetuar o pagamento. Isso faz com que o vendedor fique com um descasamento de caixa, pois ele precisa comprar matéria-prima de 30 em 30 dias.

Assim, a empresa que vendeu nos procura, nos mostra a nota fiscal da sua venda e nos pergunta se não queremos antecipar esse valor. Nós temos uma equipe de risco que analisa a empresa que comprou e liga para ela para confirmar a compra. Com isso, nós mitigamos o risco de performance, pois o produto da venda já foi entregue, e o risco de crédito do vendedor não ter recursos financeiros para continuar a produzir.

O meu risco passa a ser a empresa compradora pagar o fundo. Tendo essas confirmações, nós aplicamos uma taxa de desconto e antecipamos o valor ao vendedor, com o FIDC ficando com esse spread. Essa é uma operação básica de direitos creditórios.

Na maioria das vezes, nós financiamos empresas menores, que possuem um nível de governança menor, e que muitas vezes não possuem um balanço auditado por uma Big Four, o que faz com o FIDC precise de uma área de crédito bem robusta. Como essas empresas não são auditadas, elas têm um limite de crédito menor junto aos bancos, o que faz com que elas procurem o mercado de direito creditório. Como elas têm mais risco, as taxas aplicadas nesse tipo de operação são mais altas.

Os FIDCs possuem duas categorias: os fundos de direitos creditórios padronizados, que só fazem operações de desconto de determinada modalidade, como cartões de crédito, e os fundos de direitos creditórios não padronizados, que podem fazer operações com um risco maior, como desconto de precatórios ou operações de crédito com empresas em recuperação judicial. No caso dos fundos não padronizados, eles estão limitados a investidores profissionais. É por isso que quase não se vê esse tipo de produto rodando por aí.

O operacional mais pesado de um FIDC se reflete na taxa de administração?

Sim. As taxas de administração e de gestão praticadas por um FIDC são próximas das taxas dos fundos multimercado. Como falamos no mercado, 2 com 20 (2% de taxa de administração e 20% de taxa de performance). Agora, nós investimos muito em tecnologia para minimizarmos um pouco a parte operacional, pois um FIDC, realmente, requer um trabalho manual muito grande. Existem FIDCs de R$ 500 milhões, R$ 600 milhões, com quase 300 pessoas trabalhando.

Por exemplo, a emissão de uma nota comercial de R$ 500 mil dá, praticamente, o mesmo trabalho que uma operação de R$ 30 milhões. Nos dois casos, o balanço será analisado, as visitas e as checagens serão feitas, e a operação será estruturada e explicada ao administrador para que ele possa compreendê-la, principalmente as garantias.

Quando as pessoas físicas puderem investir em FIDCs, elas vão se deparar com FIDCs mais agressivos e mais conservadores?

Sim. No futuro, uma pessoa física pode se deparar com dois FIDCs. O fundo A, com 20% de subordinação (cotas que assumem o risco da operação, mas que possuem uma rentabilidade maior) e 80% de cotas seniores (cotas que não assumem o risco da operação, mas que possuem uma rentabilidade menor), com elas pagando 110% do CDI, mas fazendo operações de desconto para fornecedores de uma empresa Triple A com risco superbaixo.

O fundo B, com 30% de subordinação e 70% de cotas seniores, com elas pagando 150% do CDI, mas fazendo operações de desconto para fornecedores de uma empresa de um setor mais arriscado, como o calçadista.

Qual deles é o melhor? Depende. O fundo A remunera menos e tem menos subordinação, mas tem menos risco, pois só vai fazer operações com os fornecedores de uma empresa Triple A. O fundo B tem mais risco, mas também tem mais subordinação para dar um pouco mais de conforto ao cotista sênior, dando um pouco mais de prêmio a ele.

Da mesma forma que existem gestoras que fazem um trabalho espetacular de análise de cotas de FIDCs, os investidores pessoa física terão que olhar mais fundo para ver o que há debaixo de um FIDC. É a sua gestora que faz a análise das empresas? É ela que faz as visitas? É ela que estruturou as operações que estão lá dentro? Qual é o processo de avaliação de crédito?

Quando um FIDC será uma boa opção de investimento para um investidor pessoa física?

Esse tipo de produto será complementar ao investidor que já se sente confortável em investir em crédito privado e que vê esse investimento como uma poupança de longo prazo. Se o investidor montar seu portfólio e quiser 30% de liquidez, isso já vai eliminar os FIDCs.

Pelo lado das gestoras, eu acredito que a maioria delas ainda vai querer ter o conforto de ter um fundo de prazo fechado, justamente para poder dar rentabilidade sem ter susto dos dois lados.

Os FIDCs são um bom produto, mas o investidor precisará ter plena consciência de que, na sua escala liquidez versus risco, eles vão estar nas últimas posições. Ele não vai poder contar com esses recursos numa eventual emergência, mas, por outro lado, o FIDC é um dos que vai mais colaborar com seu patrimônio no longo prazo. A pessoa física deve pensar num FIDC como um fundo de previdência.

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