TRF 3ª REGIÃO - CRA X FACTORING - DESNECESSIDADE DE REGISTRO NO CRA

DIÁRIO ELETRÔNICO DA JUSTIÇA FEDERAL DA 3ª REGIÃO
Edição nº 218/2015 - São Paulo, quinta-feira, 26 de novembro de 2015

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO


PUBLICAÇÕES JUDICIAIS I – TRF

Subsecretaria da 3ª Turma

Expediente Processual 40734/2015


APELAÇÃO CÍVEL Nº 0007352-95.2015.4.03.6100/SP
    2015.61.00.007352-4/SP
RELATOR : Desembargador Federal CARLOS MUTA
APELANTE : Conselho Regional de Administracao de Sao Paulo CRA/SP
ADVOGADO : SP211620 LUCIANO DE SOUZA
APELADO(A) : CREDERE CONSULTORIA E FOMENTO MERCANTIL LTDA
ADVOGADO : SP247167 JEFFERSON LUIZ DE LIRA CARDOSO e outro(a)
No. ORIG. : 00073529520154036100 8 Vr SAO PAULO/SP
DECISÃO
Vistos etc.
Trata-se de apelação, em ação ordinária, objetivando afastar a obrigatoriedade de registro perante o conselho profissional, bem como a nulidade das autuações lavradas pelo Conselho Regional de Administração de São Paulo a tal título.
A sentença julgou procedente o pedido, reconhecendo que a autora não está obrigada a registrar-se no conselho réu, anulando o auto de infração S002574, condenando-o ao pagamento de verba honorária de R$ 2.000,00 (dois mil reais)
Alegou o CRA, em suma, que é inaplicável a decisão proferida nos Embargos de Divergência em RESP 1.236.002, pois naquele caso a empresa apenas realizava a aquisição de crédito e, no presente caso, a autora presta diversos serviços, tais como alavancagem mercadológica, acompanhamento de contas a receber e a pagar, seleção e avaliação de sacados-devedores ou fornecedores das empresas-clientes, e factoring no comércio internacional, atividades que lhe impõe o respectivo registro.
Com contrarrazões, subiram os autos a esta Corte.
DECIDO.
A hipótese comporta julgamento na forma do artigo 557 do Código de Processo Civil.
Consta da sentença (f. 179/184), in verbis:
"[...]
Julgo a lide no estado atual. As questões suscitadas pelas partes podem ser resolvidas com base na prova constante dos autos (artigo 330, inciso I, do Código de Processo Civil).
A Lei n 4.769/65 define no artigo 2, "a" e "b", as atividades que determinam a obrigatoriedade da inscrição no respectivo Conselho Regional de Administração:
Art. 2º. A atividade profissional de Administrador será exercida, como profissão liberal ou não, mediante:
a) pareceres, relatórios, planos, projetos, arbitragens, laudos, assessoria em geral, chefia intermediária, direção superior;
b) pesquisas, estudos, análise, interpretação, planejamento, implantação, coordenação e controle dos trabalhos nos campos da Administração, como administração e seleção de pessoal, organização e métodos, orçamentos, administração de material, administração financeira, administração mercadológica, administração de produção, relações industriais, bem como outros campos em que esses desdobrem ou aos quais sejam conexos.
Por sua vez, o artigo 1º da Lei nº 6.839/80 dispõe que:
Art. 1º O registro de empresas e a anotação dos profissionais legalmente habilitados, delas encarregados, serão obrigatórios nas entidades competentes para a fiscalização do exercício das diversas profissões, em razão da atividade básica ou em relação àquela pela qual prestem serviços a terceiros.
A obrigatoriedade do registro no Conselho Regional de Administração ocorre se a empresa tem como atividade básica alguma das descritas no artigo 2º da Lei nº 4.769/65.
O objeto social da autora é o seguinte, segundo seu contrato social:
A sociedade terá por objetivo efetuar negócios de fomento mercantil (factoring), que consiste:
a) na aquisição à vista, total ou parcial, de direitos creditórios resultantes de vendas mercantis e/ou de prestação de serviços realizadas a prazo por suas empresas-clientes contratantes;
b) conjugadamente com a aquisição dos títulos, a empresa poderá realizar a prestação de serviços, em caráter contínuo, de alavancagem mercadológica ou de acompanhamento das contas a receber e a pagar ou de seleção e avaliação dos sacados-devedores ou dos fornecedores das empresas-clientes contratantes;
c) realização de negócios de factoring no comércio internacional de exportação e importação.
A autora não tem apenas como atividade a aquisição de direitos creditórios resultantes de vendas mercantis ou de prestação de serviços.
Ela exerce também, "conjugadamente com a aquisição dos títulos", as atividades de prestação de serviços a terceiros de "alavancagem mercadológica ou de acompanhamento das contas a receber e a pagar ou de seleção e avaliação dos sacados-devedores ou dos fornecedores das empresas-clientes contratantes" e "realização de negócios de factoring no comércio internacional de exportação e importação".
Em razão do objeto social da autora, cabe saber se a prestação, a terceiros, de serviços, conjugadamente com a aquisição dos títulos, de "alavancagem mercadológica", de "acompanhamento das contas a receber e a pagar" e de "seleção e avaliação dos sacados-devedores ou dos fornecedores das empresas-clientes contratantes", além da "realização de negócios de factoring no comércio internacional de exportação e importação" está ou não compreendida entre as atividades que determinam o registro no Conselho Regional de Administração, previstas na Lei n 4.769/65, artigo 2, "a" e "b", especialmente a assessoria em geral e administração financeira e mercadológica, previstos nesta lei.
Isso porque o simples fato de o objeto social da autora descrever tais atividades é suficiente para determinar se existe ou não a obrigação de ela registrar-se nesse conselho profissional, ainda que ela, em certo momento, não as execute, no todo ou em parte. Isso porque, estando compreendidas no objeto social, tais atividades poderão ser exercidas pela autora a qualquer tempo.
Na petição inicial a autora trata a questão como se seu objeto social compreendesse apenas a atividade de "aquisição à vista, total ou parcial, de direitos creditórios resultantes de vendas mercantis e/ou de prestação de serviços realizadas a prazo por suas empresas-clientes contratantes". Mas não é apenas esse seu objeto social, conforme já assinalado anteriormente.
Daí por que este julgamento não pode ser limitado apenas à análise da atividade de "aquisição à vista, total ou parcial, de direitos creditórios resultantes de vendas mercantis e/ou de prestação de serviços realizadas a prazo por suas empresas-clientes contratantes". Este julgamento deve compreender também a análise dos demais objetivos sociais descritos no ato constitutivo da autora, o contrato social.
É certo que, na jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, havia divergência em relação à obrigatoriedade do registro das empresas da factoring no Conselho Regional de Administração. De um lado, há precedentes da Primeira Turma do Superior Tribunal de Justiça que afastam a obrigatoriedade do registro das empresas da factoring no Conselho Regional de Administração:
ADMINISTRATIVO. RECURSO ESPECIAL. EMPRESA DE FACTORING. DESNECESSIDADE DE REGISTRO NO CONSELHO REGIONAL DE ADMINISTRAÇÃO. ATIVIDADE BÁSICA. SÚMULA 7/STJ. PRECEDENTES. COMPRA DE ATIVOS OU DIREITOS CREDITÓRIOS DECORRENTES DE VENDAS MERCANTIS A PRAZO.
1. A obrigatoriedade da inscrição das empresas em determinado Conselho profissional, é ditada pela "atividade básica ou em relação àquela pela qual prestem serviços a terceiros" independentemente do profissional que devam contratar para a realização da tarefa. Precedentes:AgRg no REsp 1020819/SC, DJ 09.05.2008;AgRg no REsp 928.810/ES, DJ 19.11.2007;REsp 867.945/RS, DJ 22.03.2007.
2. O artigo 1º da Lei nº 6.839/80, dispõe que o registro de tais empresas e a anotação dos profissionais legalmente habilitados serão obrigatórios em razão da atividade básica ou em relação àquela pela qual prestem serviços a terceiros, e não em relação à atividades secundárias.
3. As empresas que desempenham atividades relacionadas ao factoring estão dispensadas da obrigatoriedade de registro no Conselho Regional de Administração, porquanto comercializam títulos de crédito.
4. As atividades desempenhadas pelas empresas de factorings na modalidade convencional, que envolve funções de compra de crédito (cessão de crédito) e prestação de serviços convencionais (análise de riscos dos títulos e cobrança de créditos da faturizada) não estão no alcance da fiscalização profissional do Conselho Federal de Administração - CRA, porquanto sua atividade-fim não se enquadra nas hipóteses elencadas como de natureza administrativa.
5. O campo de atuação do factoring é a compra de ativos ou direitos creditórios decorrentes de vendas mercantis a prazo. Negociam-se direitos gerados pelas vendas mercantis a prazo, mas sem o recurso do desconto dos títulos de crédito. Faz-se a compra mediante um preço, por meio do endosso como instrumento do ato translativo da propriedade dos direitos creditórios. (Arnaldo Rizzardo, In Factoring, 3ª edição, RT, páginas 82/83) 6. É cediço que somente na modalidade de factoring conhecida por trustee o faturizador prestará serviços diferenciados, como co-gestão, consultoria etc. Podemos afirmar - sem nenhuma dúvida - que é raro uma operação de factoring que envolva a modalidade trustee. A mais usualmente praticada é a modalidade convencional. E na modalidade convencional de factoring, os serviços prestados, quando o são, não envolvem administração, consultoria ou co-gestão, pois tais serviços são próprios somente na modalidade trustee." (Antonio Carlos Donini, in Inexigibilidade do Registro da Empresa de Factoring junto ao Conselho Regional de Administração, Revista dos Tribunais, ano 92 - volume 810 - abril de 2003 - páginas 84/85).
7. A única modalidade que, em tese, pode-se admitir a prática de atos ditos "administrativos" de factoring é na modalidade trustee, por envolver prestação de serviços diferenciados, a saber, co-gestão e consultoria, situação cuja análise resta obstada nesta instância à luz do verbete sumular nº 7/STJ, por impor o revolvimento da matéria fático-probatória.
8. In casu, o objeto da sociedade é prestar serviços de gestão comercial, executados em caráter cumulativo e contínuo, adquirir direitos creditório decorrentes de vendas mercantis a prazo; efetuar cobranças por conta própria e de terceiros, ceder seus direitos a terceiros, e efetuar negócios de "Factoring" no mercado interno e internacional de importação e exportação.
9. O Tribunal de origem assentou que: "Como se vê, a empresa não tem como atividade principal nenhuma daquelas constantes na Lei nº 4.769/65 que a obrigariam ao registro no Conselho de Administração, " assertiva que impõe a não sujeição da recorrida à inscrição no Conselho de Classe, ora recorrente, bem como a insindicabilidade pelo E. STJ (Súmula 07).
10. Recurso especial parcialmente conhecido, e nesta parte desprovido (REsp 932.978/SC, Rel. Ministro LUIZ FUX, PRIMEIRA TURMA, julgado em 06/11/2008, DJe 01/12/2008).
PROCESSUAL CIVIL. ADMINISTRATIVO. INSCRIÇÃO NO CONSELHO REGIONAL DE ADMINISTRAÇÃO. EMPRESA DE FACTORING. INEXIGIBILIDADE. RECURSO ESPECIAL A QUE SE DÁ PROVIMENTO (REsp 955.353/SC, Rel. Ministro TEORI ALBINO ZAVASCKI, PRIMEIRA TURMA, julgado em 17/02/2009, DJe 05/03/2009).
De outro lado, a Segunda Turma do Superior Tribunal de Justiça adotava a interpretação - inclusive em julgamentos mais recentes - de que as empresas que têm como objeto a exploração do factoring estão sujeitas à inscrição no respectivo Conselho Regional de Administração:
ADMINISTRATIVO. CONSELHO REGIONAL DE ADMINISTRAÇÃO. FACTORING. ATIVIDADE SUJEITA A REGISTRO.1. A Segunda Turma do Superior Tribunal de Justiça possui entendimento de que as empresas que têm como objeto a exploração do factoring estão sujeitas à inscrição no respectivo Conselho Regional de Administração.2. Recurso Especial provido (REsp 1013310/RJ, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 10/03/2009, DJe 24/03/2009).
ADMINISTRATIVO. EMPRESA DE FACTORING. REGISTRO NO CONSELHO REGIONAL DE ADMINISTRAÇÃO. ATIVIDADE. SÚMULA 7/STJ.
1. As empresas que se dedicam à atividade de factoring estão sujeitas a registro no Conselho Regional de Administração. Precedentes: REsp 1013310/RJ, Rel. Min. Herman Benjamin, DJe 24/03/2009 e REsp 497.882/SC, Rel. Min. João Otávio de Noronha, DJU 24.05.07.
2. A alegação da empresa recorrente de que não tem como atividade principal nenhuma das arroladas na Lei nº 4.769/65 não pode ser analisada nesta instância por demandar reexame do conjunto fático-probatório dos autos.
3. Agravo regimental não provido (AgRg no Ag 1252692/SC, Rel. Ministro CASTRO MEIRA, SEGUNDA TURMA, julgado em 16/03/2010, DJe 26/03/2010).
ADMINISTRATIVO. EXERCÍCIO PROFISSIONAL. EMPRESA DE FACTORING. INSCRIÇÃO NO CONSELHO REGIONAL DE ADMINISTRAÇÃO. OBRIGATORIEDADE.
1. O Tribunal de origem dissentiu da jurisprudência pacífica da Segunda Turma desta Corte, que possui entendimento no sentido de que as empresas que têm como objeto a exploração do factoring estão sujeitas à inscrição no respectivo Conselho Regional de Administração, tendo em vista que, invariavelmente, as empresas que trabalham com essa atividade - espécie de mecanismo de fomento mercantil que possibilita a venda de créditos gerados por vendas a prazo -, desenvolvem atividades que demandam conhecimento técnico específico da área da Administração. (Precedente: REsp 1.013.310/RJ, Rel. Min. Herman Benjamin, Segunda Turma, julgado em 10.3.2009, DJe 24.3.2009.)
2. Não é o caso de aplicação das Súmulas 5 e 7/STJ, uma vez que o Tribunal a quo, apesar de deixar de aplicar a jurisprudência pacífica desta Corte, qual seja, que "empresa de factoring tem que ter inscrição no Conselho Regional de Administração", concluiu que sua atividade consistiria em atividade privativa de fomento mercantil.
3. Quanto à demonstração da divergência jurisprudencial, verifica-se que foi ela executada satisfatoriamente. Demais disso, há suficiente comprovação do dissídio jurisprudencial no corpo das razões recursais, cuja admissibilidade segue corroborada por se tratar de dissídio notório. Agravo regimental imp rovido (AgRg nos EDcl no REsp 1325537/ES, Rel. Ministro HUMBERTO MARTINS, SEGUNDA TURMA, julgado em 02/10/2012, DJe 10/10/2012)
PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO RECEBIDOS COMO AGRAVO REGIMENTAL. PRINCÍPIO DA FUNGIBILIDADE RECURSAL. ALEGAÇÃO DE VIOLAÇÃO A DISPOSITIVOS CONSTITUCIONAIS. COMPETÊNCIA DO STF. OFENSA AO ART. 458 DO CPC NÃO CONFIGURADA. EMPRESA DE FACTORING. REGISTRO NO CONSELHO REGIONAL DE ADMINISTRAÇÃO. NECESSIDADE.
1. Por inexistir omissão, obscuridade ou contradição na decisão embargada e pelo princípio da fungibilidade recursal, recebem-se os presentes Embargos de Declaração como Agravo Regimental.
2. O exame da violação de dispositivos constitucionais (arts. 5º, II, LIV e LV, e 93, IX, da CF/88 ) é de competência exclusiva do Supremo Tribunal Federal, conforme dispõe o art. 102, III, da Constituição Federal.
3. A solução integral da controvérsia, com fundamento suficiente, não caracteriza ofensa ao art. 458 do CPC.
4. A jurisprudência da Segunda Turma do Superior Tribunal de Justiça consolidou o entendimento de que as empresas que se dedicam à atividade de factoring estão sujeitas a registro no Conselho Regional de Administração.
5. Agravo Regimental não provido (EDcl no REsp 1297606/MG, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 27/11/2012, DJe 19/12/2012).
A divergência foi resolvida no julgamento dos Embargos de Divergência no Resp nº 1.236.002-ES (julgado em 12.11.2014), que recebeu a seguinte ementa:
ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA EM RECURSO ESPECIAL. EMPRESA DE FACTORING. ATIVIDADE DESENVOLVIDA PELA EMPRESA DE NATUREZA EMINENTEMENTE MERCANTIL. REGISTRO NO CONSELHO REGIONAL DE ADMINISTRAÇÃO. INEXIGIBILIDADE. EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA ACOLHIDOS, PARA QUE PREVALEÇA A TESE ESPOSADA NO ACÓRDÃO PARADIGMA.
1. In casu, observa-se a ocorrência de divergência de teses jurídicas aplicadas à questão atinente à obrigatoriedade (ou não) das empresas que desenvolvem a atividade de factoring em se submeterem ao registro no Conselho Regional de Administração; o dissídio está cabalmente comprovado, haja vista a solução apresentada pelo acórdão embargado divergir frontalmente daquela apresentada pelo acórdão paradigma.
2. A fiscalização por Conselhos Profissionais almeja à regularidade técnica e ética do profissional, mediante a aferição das condições e habilitações necessárias para o desenvolvimento adequado de atividades qualificadas como de interesse público, determinando-se, assim, a compulsoriedade da inscrição junto ao respectivo órgão fiscalizador, para o legítimo exercício profissional.
3. Ademais, a Lei 6.839/80, ao regulamentar a matéria, dispôs em seu art. 1º. que a inscrição deve levar em consideração, ainda, a atividade básica ou em relação àquela pela qual as empresas e os profissionais prestem serviços a terceiros.
4. O Tribunal de origem, para declarar a inexigibilidade de inscrição da empresa no CRA/ES, apreciou o Contrato Social da empresa, elucidando, dessa maneira, que a atividade por ela desenvolvida, no caso concreto, é a factoring convencional, ou seja, a cessão, pelo comerciante ou industrial ao factor, de créditos decorrentes de seus negócios, representados em títulos.
5. A atividade principal da empresa recorrente, portanto, consiste em uma operação de natureza eminentemente mercantil, prescindindo, destarte, de oferta, às empresas-clientes, de conhecimentos inerentes às técnicas de administração, nem de administração mercadológica ou financeira.
6. No caso em comento, não há que se comparar a oferta de serviço de gerência financeira e mercadológica - que envolve gestões estratégicas, técnicas e programas de execução voltados a um objetivo e ao desenvolvimento da empresa - com a aquisição de um crédito a prazo - que, diga-se de passagem, via de regra, sequer responsabiliza a empresa-cliente -solidária ou subsidiariamente - pela solvabilidade dos efetivos devedores dos créditos vendidos.
7. Por outro lado, assinale-se que, neste caso, a atividade de factoring exercida pela sociedade empresarial recorrente não se submete a regime de concessão, permissão ou autorização do Poder Público, mas do exercício do direito de empreender (liberdade de empresa), assegurado pela Constituição Federal, e típico do sistema capitalista moderno, ancorado no mercado desregulado.
8. Embargos de Divergência conhecidos e acolhidos, para que prevaleça a tese esposada no acórdão paradigma e, consequentemente, para restabelecer o acórdão do Tribunal de origem, declarando-se a inexigibilidade de inscrição da empresa embargante no CRA/ES.
Mas a mera análise dos textos dessas ementas é insuficiente para resolver a questão e delimitar com clareza todas as premissas fáticas nas quais a tese jurídica foi construída pelo Superior Tribunal de Justiça no julgamento dos Embargos de Divergência no Resp nº 1.236.002-ES.
Cabe definir, com base na leitura do inteiro teor do acórdão lavrado nesse julgamento, o que o Superior Tribunal de Justiça entende por "empresas que desenvolvem a atividade de factoring", dispensadas do registro no respectivo Conselho Regional de Administração".
A leitura do acórdão do STJ nos Embargos de Divergência no Resp nº 1.236.002-ES revela que a tese jurídica teve como premissas fáticas o objeto social descrito no contrato social da parte recorrente, da forma como delimitado pelas instâncias ordinárias.
Da leitura apenas da ementa do acórdão se extrai a afirmação de que "O Tribunal de origem, para declarar a inexigibilidade de inscrição da empresa no CRA/ES, apreciou o Contrato Social da empresa, elucidando, dessa maneira, que a atividade por ela desenvolvida, no caso concreto, é a factoring convencional, ou seja, a cessão, pelo comerciante ou industrial ao factor, de créditos decorrentes de seus negócios, representados em títulos".
Não há nenhuma dúvida, desse modo, de que o Superior Tribunal de Justiça considerou que a atividade de "cessão, pelo comerciante ou industrial ao factor, de créditos decorrentes de seus negócios, representados em títulos", não determina a inscrição no Conselho Regional de Administração.
Daí por que a atividade descrita no objeto social da autora da presente causa, consistente "na aquisição à vista, total ou parcial, de direitos creditórios resultantes de vendas mercantis e/ou de prestação de serviços realizadas a prazo por suas empresas-clientes contratantes", não a obriga a inscrever-se no Conselho Regional de Administração do Estado de São Paulo.
Esta atividade constitui o "factoring convencional, ou seja, a cessão, pelo comerciante ou industrial ao factor, de créditos decorrentes de seus negócios, representados em títulos", dispensada de registro no referido Conselho, na interpretação do STJ no julgamento dos Embargos de Divergência no Resp nº 1.236.002-ES.
O mesmo pode ser dito relativamente à atividade descrita no objeto social da autora como "realização de negócios de factoring no comércio internacional de exportação e importação". Trata-se também de "factoring convencional, ou seja, a cessão, pelo comerciante ou industrial ao factor, de créditos decorrentes de seus negócios, representados em títulos", com a única diferença que exercida relativamente à cessão de créditos quanto a negócios realizados no comércio internacional. Não há nenhuma dificuldade neste ponto.
A dificuldade surge em relação à prestação, a terceiros, de serviços conjugadamente com a aquisição dos títulos, de "alavancagem mercadológica", de "acompanhamento das contas a receber e a pagar" e de "seleção e avaliação dos sacados-devedores ou dos fornecedores das empresas-clientes contratantes", conforme descrito no objeto social previsto no contrato social da autora.
Estes trechos, extraídos do voto do Excelentíssimo Ministro relator, NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO ? em que transcrito, inclusive, o objeto social previsto no contrato social da parte recorrente ? bem auxiliam a delimitar a extensão das premissas fáticas do julgamento:
20. A sentença foi reformada pelo Tribunal de origem, que, ao invés de analisar puramente o conceito legal, apreciou o Contrato Social da empresa, elucidando, dessa maneira, que a atividade desenvolvida pela Empresa embargante, no caso concreto, é a factoring convencional; citou, para tanto, o item 3 do Contrato Social da empresa, a saber:
Outros Serviços Prestados Principalmente a Empresas, Atividades de Intermediação e agenciamento de serviços e negócios em geral sem especialização definida, Serviços de Cobrança e de Informações Cadastrais e Outras Atividades auxiliares da intermediação financeira não especificados anteriormente (factoring), conforme o item 3 do contrato social. (fls. 245).
21. Verifica-se, assim, que a atividade preponderante da empresa embargante consiste na cessão, pelo comerciante ou industrial ao factor, de créditos decorrentes de seus negócios, representados em títulos. Em contraposição, o fator devolve ao cedente o valor constante no título cedido, abatidas as quantias atinentes à sua comissão e aos encargos.
22. A atividade principal da GM FOMENTO MERCANTIL LTDA., portanto, consiste em realizar operações de natureza eminentemente mercantil , que pressupõem a prestação de serviços de apoio às empresas clientes - em regra, empresas de pequeno e médio porte - que vendem à vista, à embargante, seus créditos relativos a negócios a prazo, prescindindo, destarte, de aplicação de conhecimentos inerentes às técnicas de administração, nem de administração mercadológica ou financeira.
23. Ante as circunstâncias delineadas nos autos, evidencia-se que o entendimento que deve prevalecer corresponde àquele esposado no acórdão paradigma do REsp. 932.978/SC, de relatoria do eminente Ministro LUIZ FUX, que afirma que a atividade correspondente ao conventional factoring dispensa fiscalização profissional pelo CRA, por não estar inserida nas hipóteses legais que elencam as atividades de natureza administrativa; destaca-se, por oportuno, o trecho do voto ora mencionado:
Assim, as atividades desempenhadas pelas empresas de factorings na modalidade convencional, que envolve funções de compra de crédito (cessão de crédito), oriundo de operações mercantis, e prestação de serviços convencionais (análise de riscos dos títulos e cobrança de créditos da faturizada) não estão no alcance da fiscalização profissional do Conselho Federal de Administração - CRA, porquanto sua atividade-fim não se enquadra nas hipóteses elencadas como de natureza administrativa.
A principal função de uma empresa de factoring - induvidosamente - é fomentar as pequenas e médias empresas, por meio de compra de créditos pela faturizadora junto às empresas faturizadas, representados pelas duplicatas e cheques pós-datados advindos de vendas de produtos ou prestação de serviços.
24. E assim é porque, ao realizar operações de natureza eminentemente mercantil - descritas no item 3 de seu Contrato Social - a GM FOMENTO MERCANTIL LTDA. não oferta às suas empresas clientes serviços de administração mercadológica e financeira: apenas adquire créditos a prazo destas últimas que, diga-se de passagem, via de regra, sequer são responsáveis - solidária ou subsidiariamente - pela solvabilidade dos efetivos devedores dos créditos vendidos, salvo nos casos de avais e/ou outras formas de garantia, como é óbvio.
Os fundamentos expostos pelo Excelentíssimo Ministro Relator, NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, revelam que o Superior Tribunal de Justiça considerou irrelevante a prestação de outros serviços pelas empresas de fomento mercantil, conjugadamente com a aquisição dos créditos, tais como "Intermediação e agenciamento de serviços e negócios em geral sem especialização definida, Serviços de Cobrança e de Informações Cadastrais e Outras Atividades auxiliares da intermediação financeira não especificados anteriormente (factoring)".
O Superior Tribunal de Justiça entendeu que a atividade básica principal exercida pelas empresas de fomento mercantil, o denominado factoring convencional, é caracterizado por uma cessão, à vista, de créditos, ainda que realizada conjuntamente com uma série de outros serviços, garantias, financiamentos e contratos, tais como: gestão dos créditos, notificação da cessão, aquisição dos créditos etc.
Segundo a maioria dos Ministros que participaram do julgamento, a atividade básica principal exercida pelas empresas de fomento mercantil é que serve como parâmetro para saber da obrigatoriedade de registro no Conselho Regional de Administração, concluindo a maioria dos Ministros pela desnecessidade desse registro, ainda que prestados tais serviços.
Nesse sentido, a leitura destes trechos do voto vencido proferido nesse julgamento pelo Excelentíssimo Ministro OG FERNANDES deixa muito claro que o Superior Tribunal de Justiça não considerou relevante a prestação, pelas empresas de fomento mercantil, dos serviços considerados pelo Conselho Regional de Administração como determinantes para tornar obrigatório o registro profissional nessa autarquia:
Como se observa, factoring consiste numa atividade comercial de natureza mista e atípica, envolvendo funções de garantia, gestão de créditos e fomento mercantil.
O art. 2º da Lei n. 4.769/65 inclui entre as atividades dos administradores:
(...) pesquisas, estudos, análise, interpretação, planejamento, implantação, coordenação e contrôle dos trabalhos nos campos da administração, como administração e seleção de pessoal, organização e métodos, orçamentos, administração de material, administração financeira, relações públicas, administração mercadológica, administração de produção, relações industriais, bem como outros campos em que êsses se desdobrem ou aos quais sejam conexos.
O art. 8º, alínea "b", do citado normativo confere aos Conselhos Regionais de Administração a prerrogativa de "fiscalizar, na área da respectiva jurisdição, o exercício da profissão de Técnico de Administração".
O art. 1º da Lei 6.839/80, por sua vez, assim preceitua:
Art. 1º O registro de empresas e a anotação dos profissionais legalmente habilitados, delas encarregados, serão obrigatórios nas entidades competentes para a fiscalização do exercício das diversas profissões, em razão da atividade básica ou em relação àquela pela qual prestem serviços a terceiros.
O embargante sustenta, na linha do acórdão apontado como paradigma, que a atividade básica desempenhada pelas empresas de factoring é a simples aquisição de direito creditório resultante da venda mercantil mediante remuneração.
Consequentemente, ainda que seja possível a prestação de serviços adicionais, como o acompanhamento e aconselhamento na gestão de recursos, o núcleo de atuação dessas pessoas jurídicas não envolve função típica do administrador de empresas, daí porque não se submete à fiscalização do respectivo conselho profissional.
Em que pesem os sólidos argumentos dos que advogam a tese contrária, em meu pensar, é inevitável reconhecer a necessidade de inscrição das sociedades de fomento mercantil no Conselho de Administração.
A obrigatoriedade de registro, nos termos da Lei 6.839/80, não se resume ao serviço efetivamente prestado a terceiros, abrangendo a própria essência da empresa, ou melhor, a natureza das atividades que são prestadas no ambiente empresarial. Isso é o que se conclui quando o citado art. 1º impõe a fiscalização do conselho profissional respectivo, "em razão da atividade básica ou em relação àquela pela qual prestem serviços a terceiros".
Dessarte, seja em virtude da própria definição do serviço de factoring contida nos normativos supramencionados, seja porque não é possível desconsiderar na atividade básica dessas pessoas jurídicas a exigência de conhecimentos de administração financeira e mercadológica, a exemplo da análise dos riscos creditícios, gestão desses créditos e do acompanhamento de contas a receber, é de rigor a fiscalização do Conselho de Administração.
A interpretação preconizada no voto vencido proferido nesse julgamento pelo Excelentíssimo Ministro OG FERNANDES não prevaleceu. O Superior Tribunal de Justiça considerou irrelevante a prestação, pelas empresas de fomento mercantil, de outros serviços, conjugadamente com a atividade de aquisição de créditos, ainda que exijam conhecimentos de administração financeira e mercadológica, a exemplo da análise dos riscos creditícios, gestão desses créditos e do acompanhamento de contas a receber.
Ante o exposto, dos textos legais e do julgamento dos Embargos de Divergência no Resp nº 1.236.002-ES decorre a norma de que a empresa que exerce a atividade de fomento mercantil, consistente na aquisição à vista, total ou parcial, de direitos creditórios resultantes de vendas mercantis e/ou de prestação de serviços realizadas a prazo por suas empresas-clientes contratantes, ainda que preste alguns serviços que exijam conhecimentos de administração financeira e mercadológica, a exemplo da análise dos riscos creditícios, gestão desses créditos e do acompanhamento de contas a receber, não estão obrigadas ao registro profissional no respectivo Conselho Regional de Administração. Daí a procedência dos pedidos formulados na petição inicial.
Dispositivo
Resolvo o mérito nos termos do artigo 269, inciso I, do Código de Processo Civil, para julgar procedentes os pedidos, a fim de declarar que a autora não está obrigada a registrar-se no Conselho Regional de Administração do Estado de São Paulo e que é inexigível qualquer valor cobrado daquela por este, bem como para anular o auto de infração n.º S002574.
Condeno o réu a restituir as custas recolhidas pela autora e a pagar-lhe os honorários advocatícios no valor de R$ 2.000,00 (dois mil reais), com correção monetária a partir desta data, pelos índices da tabela das ações condenatórias em geral, sem a Selic, previstos em Resolução do Conselho da Justiça Federal.
Defiro o pedido de antecipação dos efeitos da tutela para suspender a exigibilidade dos valores cobrados pelo réu e para determinar-lhe que não lavre novos autos de infração em face da autora. A fundamentação exposta na petição inicial é mais que verossímil. Em cognição exauriente, nesta sentença, afirmei a existência do próprio direito de que a autora se afirma titular, e não apenas a verossimilhança da tese veiculada na inicial. Também está presente o risco de a autora sofrer dano de difícil reparação. Sem a suspensão da exigibilidade dos valores cobrados pelo réu a autora poderá sofrer a execução, penhora de bens e registro do nome em cadastros de inadimplentes. Além disso, a abstenção do réu de lavrar novos autos de infração evita o ajuizamento de novas demandas.
Registre-se. Publique-se."
Com efeito, exsurge dos autos que a autora foi notificada em 13/03/2015 a proceder ao registro perante o Conselho Regional de Administração de São Paulo, após este negar-lhe provimento ao recurso administrativo, sob o fundamento de que as atividades por ela exercidas impõe o respetivo registro (f. 43/52).
Segundo contrato social da empresa, cuja alteração contratual foi registrada na JUCESP em 16/01/2014, consta como objeto social: "operações de fomento mercantil (factoring), que consiste: a) na aquisição à vista, total ou parcial, de direitos creditórios resultante de vendas mercantis e/ou de prestação de serviços realizadas a prazo por suas empresas clientes-contratantes; b) conjugadamente com a aquisição de títulos, a empresa poderá realizar a prestação de serviços, em caráter contínuo, de alavancagem mercadológica ou de acompanhamento das contas a receber e a pagar ou de seleção e avaliação dos sacados-devedores ou dos fornecedores das empresas-clientes contratantes; c) realização de negócios de factoring no comércio internacional de exportação e importação" (f. 25/30).
Encontra-se consolidada a jurisprudência, forte no que dispõe o artigo 1º da Lei 6.839/80, no sentido de que o critério definidor da exigibilidade de registro junto a conselho profissional é a identificação da atividade básica ou natureza dos serviços prestados, conforme revelam, entre outros, os seguintes precedentes:
RESP 1.214.581, Rel. Min. MAURO CAMPBELL, DJE 03/02/2011: "PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. CONSELHO REGIONAL DE ADMINISTRAÇÃO. HOLDING. REGISTRO. PRETENSÃO RECURSAL. SÚMULA 7/STJ. 1. O critério legal para a obrigatoriedade de registro perante os conselhos profissionais, bem como para a contratação de profissional de qualificação específica, é determinado pela atividade básica ou pela natureza dos serviços prestados pela empresa. 2. O fato de a empresa ser uma holding porque é constituída exclusivamente pelo capital de suas coligadas não torna obrigatório seu registro no órgão fiscalizador, mas a natureza dos serviços que presta a terceiros. 3. A pretensão recursal de infirmar a conclusão a que chegou o acórdão recorrido que, apoiado nas provas dos autos, afirma que a empresa exerce atividade de administração a terceiros, demandaria a incursão na seara fática, o que é vedado na via especial, a teor da Súmula 7 desta Corte. 4. Recurso especial não conhecido."
AMS 2008.61.00026502-0, Rel. Des. Fed. CARLOS MUTA, DJF3 12/01/2010: "PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INOMINADO. MANDADO DE SEGURANÇA. CRMV. REGISTRO. ARTIGO 27 DA LEI Nº 5.517/68, COM A REDAÇÃO DADA PELA LEI Nº 5.634/70. CONTRATAÇÃO DE TÉCNICO RESPONSÁVEL. ARTIGO 6º, IV DO DECRETO Nº 1.662/95. EMPRESAS CUJO OBJETO SOCIAL É O COMÉRCIO VAREJISTA DE ANIMAIS VIVOS PARA CRIAÇÃO DOMÉSTICA, ACESSÓRIOS PARA CRIAÇÃO DE ANIMAIS, AGROPECUÁRIA, E ARTIGOS PARA PESCA E CAMPING. 1. A Lei n.º 6.839/80, em seu artigo 1º, obriga ao registro apenas as empresas e os profissionais habilitados que exerçam a atividade básica, ou prestem serviços a terceiros, na área específica de atuação, fiscalização e controle do respectivo conselho profissional. 2. Caso em que restou comprovado pelas impetrantes que o seu objeto social não se enquadra em qualquer das hipóteses que, legalmente, exigem o registro, perante o CRMV, para efeito de fiscalização profissional. 3. Precedentes do Superior Tribunal de Justiça e desta Corte e Turma. 4. Agravo desprovido."
Sobre a obrigatoriedade ou não da inscrição das empresas de factoring no Conselho Regional de Administração, o Superior Tribunal de Justiça proferiu, recentemente, o seguinte julgado em embargos de divergência:
ERESP 1.236.002, Rel. Min. NAPOLEÃO MAIS, DJe 25/11/2014: "ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA EM RECURSO ESPECIAL. EMPRESA DE FACTORING . ATIVIDADE DESENVOLVIDA PELA EMPRESA DE NATUREZA EMINENTEMENTE MERCANTIL. REGISTRO NO CONSELHO REGIONAL DE ADMINISTRAÇÃO. INEXIGIBILIDADE. EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA ACOLHIDOS, PARA QUE PREVALEÇA A TESE ESPOSADA NO ACÓRDÃO PARADIGMA. 1. In casu, observa-se a ocorrência de divergência de teses jurídicas aplicadas à questão atinente à obrigatoriedade (ou não) das empresas que desenvolvem a atividade de factoring em se submeterem ao registro no Conselho Regional de Administração; o dissídio está cabalmente comprovado, haja vista a solução apresentada pelo acórdão embargado divergir frontalmente daquela apresentada pelo acórdão paradigma. 2. A fiscalização por Conselhos Profissionais almeja à regularidade técnica e ética do profissional, mediante a aferição das condições e habilitações necessárias para o desenvolvimento adequado de atividades qualificadas como de interesse público, determinando-se, assim, a compulsoriedade da inscrição junto ao respectivo órgão fiscalizador, para o legítimo exercício profissional. 3. Ademais, a Lei 6.839/80, ao regulamentar a matéria, dispôs em seu art. 1o. que a inscrição deve levar em consideração, ainda, a atividade básica ou em relação àquela pela qual as empresas e os profissionais prestem serviços a terceiros. 4. O Tribunal de origem, para declarar a inexigibilidade de inscrição da empresa no CRA /ES, apreciou o Contrato Social da empresa, elucidando, dessa maneira, que a atividade por ela desenvolvida, no caso concreto, é a factoring convencional, ou seja, a cessão, pelo comerciante ou industrial ao factor, de créditos decorrentes de seus negócios, representados em títulos. 5. A atividade principal da empresa recorrente, portanto, consiste em uma operação de natureza eminentemente mercantil, prescindindo, dest'arte, de oferta, às empresas-clientes, de conhecimentos inerentes às técnicas de administração, nem de administração mercadológica ou financeira. 6. No caso em comento, não há que se comparar a oferta de serviço de gerência financeira e mercadológica - que envolve gestões estratégicas, técnicas e programas de execução voltados a um objetivo e ao desenvolvimento da empresa - com a aquisição de um crédito a prazo - que, diga-se de passagem, via de regra, sequer responsabiliza a empresa-cliente -solidária ou subsidiariamente - pela solvabilidade dos efetivos devedores dos créditos vendidos. 7. Por outro lado, assinale-se que, neste caso, a atividade de factoring exercida pela sociedade empresarial recorrente não se submete a regime de concessão, permissão ou autorização do Poder Público, mas do exercício do direito de empreender (liberdade de empresa), assegurado pela Constituição Federal, e típico do sistema capitalista moderno, ancorado no mercado desregulado. 8. Embargos de Divergência conhecidos e acolhidos, para que prevaleça a tese esposada no acórdão paradigma e, consequentemente, para restabelecer o acórdão do Tribunal de origem, declarando-se a inexigibilidade de inscrição da empresa embargante no CRA /ES."
Como bem observou a sentença recorrida, o caso dos autos enquadra-se na hipótese apreciada pela superior instância, pois a atividade básica principal, descrita no objeto social da autora, se caracteriza como atividade tipicamente mercantil, assim inserida na definição de factoring convencional, embora possa existir a previsão de outras atividades, conjugada e secundariamente, tais como serviços de alavancagem mercadológica ou de cobrança e avaliação cadastral dos devedores, justamente como se verifica no presente feito e conforme entendimento extraído dos fundamentos do voto do acórdão paradigma, prevalente. Dessa forma, não se sujeita à inscrição perante o Conselho Regional de Administração, como fundamentado na sentença.
Ante o exposto, com esteio no artigo 557 do Código de Processo Civil, nego seguimento à apelação.
Publique-se.
Oportunamente, baixem os autos à Vara de origem.
São Paulo, 19 de novembro de 2015.
ELIANA MARCELO
Juíza Federal Convocada