TJRS - ISS - BASE DE CÁLCULO NO FACTORING - EXCLUSIVAMENTE SERVIÇOS PRESTADOS

APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO TRIBUTÁRIO. MANDADO DE SEGURANÇA. ISS. ATIVIDADE DE FACTORING. BASE DE CÁLCULO. INCIDÊNCIA SOBRE O VALOR DO SERVIÇO PRESTADO.O lucro obtido pela empresa de “factoring” decorrente da diferença entre o preço pelo qual comprou o crédito e o preço recebido do devedor não constitui base de cálculo do ISS. Portanto, incide o ISS, tão somente, sobre o valor do serviço prestado. RECURSO DE APELAÇÃO PROVIDO.
 
Apelação Cível

Vigésima Segunda Câmara Cível - Serviço de Apoio à Jurisdição

Nº 70021762190 (N° CNJ: 0002009-81.2007.8.21.7000)

Comarca de Passo Fundo

CVL FOMENTO COMERCIAL LTDA - APELANTE
PREFEITO MUNICIPAL DE PASSO FUNDO -  APELADO
 
ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos os autos.

Acordam os Magistrados integrantes da Vigésima Segunda Câmara Cível - Serviço de Apoio à Jurisdição do Tribunal de Justiça do Estado, à unanimidade, em dar provimento ao recurso de apelação.

Custas na forma da lei.

Participaram do julgamento, além da signatária, os eminentes Senhores Des.ª Maria Isabel de Azevedo Souza (Presidente e Revisora) e Des. Carlos Eduardo Zietlow Duro.

Porto Alegre, 28 de agosto de 2014.
 
DR.ª ADRIANA DA SILVA RIBEIRO,
Relatora.

RELATÓRIO

Dr.ª Adriana da Silva Ribeiro (RELATORA)

CVL FOMENTO COMERCIAL LTDA apela da sentença que em sede de mandado de segurança impetrado contra o ato do PREFEITO MUNICIPAL DE PASSO FUNDO, denegou a segurança.

Em suas razões alega que é uma empresa de fomento empresarial/comercial, possuindo, portanto, uma atividade mista. Refere que a atividade desenvolvida resume-se na compra de ativos das empresas/clientes, ou seja, seus clientes trazem os títulos de crédito originados em compra e venda mercantil e os vende à empresa de fomento. Sustenta que para existir a prestação de serviços a empresa de fomento deveria gerenciar todo o crédito da empresa fomentada, o que não ocorre no presente caso, pois a empresa adquire os títulos da fomentada e assume todo o risco existente para o recebimento, ou seja, inexiste, nesse caso, o direito de regresso. Assevera que, considerando a atividade mista, que é composta pela prestação de serviços como também pela aquisição de ativos, pode ainda a empresa de fomento mercantil exercer cada um separadamente, razão pela qual tem que ser considerada como base de cálculo somente aquilo que for serviço, eis que a compra de ativo jamais pode ser confundida com serviços. Afirma que o Município pretende ampliar a base de cálculo do ISS, para o fim de incidir sobre os valores que não se constituem em serviço.

Postula o provimento do recurso para o fim de reconhecer que os valores percebidos pela empresa de fomento mercantil/empresarial a título de deságio não deverão ser considerados como base de cálculo para a incidência do ISS, eis que esta remuneração não é considerada serviço.

Recebido o apelo no duplo efeito.

Contrarrazões apresentadas às fls. 147-151.

O Ministério Público, nesta instância, opinou pelo desprovimento do recurso.

Os autos foram distribuídos originariamente à Desa. Mara Larsen Chechi e, por força, da Portaria 15/2014 do Órgão Especial, vieram-me conclusos em 28.03.2014.

É o relatório.

VOTOS

Dr.ª Adriana da Silva Ribeiro (RELATORA)

Eminentes Colegas.

Conheço do recurso, porquanto presentes os requisitos de admissibilidade recursal.

Trata-se de mandado de segurança que objetiva a anulação do lançamento de nº 258/2005, referente à cobrança do ISS, pois a base de cálculo utilizada pelo Município se mostra equivocada. Argumenta a empresa impetrante que a base de cálculo do ISS é o valor dos serviços, excluída a parcela referente ao diferencial entre a compra do faturamento e sua realização pela empresa de “factoring”.

O Imposto Sobre Serviços – ISS, de competência dos Municípios, encontra previsão constitucional no art. 156, III, da Constituição Federal, nos seguintes termos:

Art. 156. Compete aos Municípios instituir impostos sobre:
(...)
III - serviços de qualquer natureza, não compreendidos no art. 155, II[1], definidos em lei complementar.
(...)
§ 3º Em relação ao imposto previsto no inciso III do caput deste artigo, cabe à lei complementar:
I - fixar as suas alíquotas máximas e mínimas;
II - excluir da sua incidência exportações de serviços para o exterior.
III - regular a forma e as condições como isenções, incentivos e benefícios fiscais serão concedidos e revogados.
 
Inicialmente, o Decreto-Lei nº 406/68, com a redação dada pela Lei Complementar nº 56/87 previa a incidência do ISS sobre a atividade de factoring, conforme item nº 48 da lista de serviços, a saber:

48. Agenciamento, corretagem ou intermediação de contratos de franquia (franchise) e de faturação (factoring) (excetuam-se os serviços prestados por instituições autorizadas a funcionar pelo Banco Central);
 
A Lei Complementar nº 116, de 31 de julho de 2003, em seu artigo 1º, define como fato gerador do Imposto Sobre Serviços “a prestação de serviços constantes da lista anexa, ainda que esses não se constituam como atividade preponderante do prestador”. Os itens 10.04 e 17.23 elencam, como serviços tributáveis pelo ISS, as operações de factoring, nos seguintes termos:

10.04 – Agenciamento, corretagem ou intermediação de contratos de arrendamento mercantil (leasing), de franquia (franchising) e de faturização (factoring).
17.23 – Assessoria, análise, avaliação, atendimento, consulta, cadastro, seleção, gerenciamento de informações, administração de contas a receber ou a pagar e em geral, relacionados a operações de faturização (factoring).
 
Desse modo, considerando que a atividade realizada pelo faturizador consiste em uma autêntica prestação de serviços, e não em uma atividade financeira, é plenamente cabível a incidência de ISS sobre os serviços de factoring.

Quanto à base de cálculo do ISS, o entendimento dominante nesta Corte e nos Tribunais Superiores é no sentido de que o lucro obtido pela empresa de “factoring” decorrente da diferença entre o preço pelo qual comprou o crédito e o preço recebido do devedor não constitui base de cálculo do ISS. Portanto, incide o ISS, tão somente, sobre o valor do serviço prestado.

A corroborar, pois, com o entendimento declinado, os seguintes precedentes desta Corte e do Superior Tribunal de Justiça:
 
TRIBUTÁRIO. ISS. FACTORING. BASE DE CÁLCULO.

1. "Da interpretação sistemática das normas jurídicas acima, conclui-se que não incide o ISS sobre a compra de direitos creditórios resultantes de vendas mercantis a prazo ou de prestação de serviços" (REsp 552.076/RS, Rel. Min. Denise Arruda, Primeira Turma, DJ 02/08/1997).
2. "A intermediação financeira de recursos, dentre os quais a aquisição de direitos creditórios, é operação tipicamente bancária, nada tendo a ver com a atividade de "factoring" (Resp 591.842/RS, Rel. Min. Eliana Calmon, Segunda Turma, DJ 06/03/2006).
3. Recurso especial provido para determinar que a base de cálculo do ISS, nas atividades de "factoring", incida sobre o preço do serviço cobrado, sem inclusão do lucro obtido pela empresa em decorrência da diferença de compra do título e do valor recebido do devedor.
(REsp 998.566/RS, Rel. Ministro JOSÉ DELGADO, PRIMEIRA TURMA, julgado em 22/04/2008, DJe 21/05/2008)
 
APELAÇÃO CÍVEL. EXECUÇÃO FISCAL. EMBARGOS DO DEVEDOR. ISS. OPERAÇÕES DE FACTORING. INCIDÊNCIA DO TRIBUTO. A Lei Complementar n. 116/2003 não define o que seja serviço, apenas os declara, para os efeitos do inciso III do art. 156 da Carta Federal. O contrato de faturização é aquele em que um comerciante cede a outro, na totalidade ou em parte, os créditos decorrentes de suas vendas mercantis a terceiro, mediante pagamento de uma remuneração. Evidente a existência de prestação de serviço entre o faturizado e o faturizador, mediante pagamento de remuneração, como previsto no item 10.04 da Lista Anexa à Lei Complementar n. 116/2003. Incidência do ISS sobre o agenciamento do contrato de fatorização. Modificação de entendimento em razão do RE 592.905, com repercussão geral. Apelação desprovida. (Apelação Cível Nº 70059359471, Vigésima Primeira Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Marco Aurélio Heinz, Julgado em 21/05/2014)
 
APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO TRIBUTÁRIO. ISS. POSSIBILIDADE DE INCIDÊNCIA DO ISS SOBRE OS SERVIÇOS DE FACTORING. BASE DE CÁLCULO. I. À luz do disposto no item 48 da lista anexa ao Decreto-Lei 406/68, com a redação conferida pela Lei Complementar n. 56/87 e da Lei Complementar n. 116/2003, nos itens 10 e 17 da Lista Anexa, é plenamente cabível a incidência de ISS sobre os serviços de factoring. II. Base de cálculo. A compra de direitos creditórios não se insere no conceito de prestação de serviço, hipótese de incidência do ISS, pelo que descabida a sua incidência sobre tais verbas. O lançamento tributário efetivado tendo por base de cálculo a renda bruta da empresa embargante é nulo. III. Na hipótese em concreto, a parte autora não logrou demonstrar se o lançamento tributário efetivado pelo Fisco Municipal teve por base de cálculo a renda bruta da empresa, ônus que lhe competia, a teor do disposto no art. 333, I, do Código de Processo Civil. APELAÇÃO DESPROVIDA. (Apelação Cível Nº 70057830069, Primeira Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Luiz Felipe Silveira Difini, Julgado em 30/01/2014) Grifei.

APELAÇÃO CÍVEL. RECURSO ADESIVO. DIREITO TRIBUTÁRIO. ISS. FACTORING. INCIDÊNCIA. BASE DE CÁLCULO. NULIDADE DO AUTO DE INFRAÇÃO. PROCEDÊNCIA. SUCUMBÊNCIA REDEFINIDA. 1. Há incidência de ISS sobre serviço de factoring. Decreto-Lei n. 406/68 e Lei Complementar n. 116/03. 2. A base de cálculo do ISS no serviço de "factoring" corresponde ao preço do serviço, sem inclusão do lucro obtido pela empresa em decorrência da diferença de compra de títulos. APELAÇÃO DESPROVIDA E RECURSO ADESIVO PROVIDO . (Apelação Cível Nº 70022356893, Segunda Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Denise Oliveira Cezar, Julgado em 27/08/2008) Grifei.
 
Voto, pois, pelo provimento do recurso de apelação, concedendo a segurança, para o fim de reconhecer que os valores percebidos pela empresa de fomento a título de deságio dos títulos não deverão ser considerados como base de cálculo para a incidência do ISS.

Sem condenação em honorários, a teor das Súmulas nº 512 do STF e 105 do STJ.

A isenção do pagamento das custas processuais não elide a responsabilidade do Município pelo reembolso dos valores pagos de forma adiantada pela parte vencedora, consoante estatuído no parágrafo único do artigo 11 da Lei nº 8.121/85.
 
Des.ª Maria Isabel de Azevedo Souza (PRESIDENTE E REVISORA) - De acordo com o(a) Relator(a).
Des. Carlos Eduardo Zietlow Duro - De acordo com o(a) Relator(a).
 
DES.ª MARIA ISABEL DE AZEVEDO SOUZA - Presidente - Apelação Cível nº 70021762190, Comarca de Passo Fundo: "À UNANIMIDADE, DERAM PROVIMENTO AO RECURSO DE APELAÇÃO."
 
Julgador(a) de 1º Grau: LUIS CHRISTIANO ENGER AIRES.
 
[1] Art. 155. Compete aos Estados e ao Distrito Federal instituir impostos sobre: II - operações relativas à circulação de mercadorias e sobre prestações de serviços de transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação, ainda que as operações e as prestações se iniciem no exterior.