TJSP - FACTORING - AQUISIÇÃO DE DUPLICATAS COM DEFEITO FORMAL - MESMO SENDO DUPLICATAS ACEITAS PERDERAM A QUALIDADE DE TÍTULO DE CRÉDITO

Ementa: Duplicatas. Defeito formal na emissão de natureza grave e substancial. Inviabilidade de reparação mediante o aceite lançado no titulo ou por declarações de confirmação do negócio. Recurso improvido.

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

Registro: 2014.0000553703

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação nº 0007927-43.2007.8.26.0302, da Comarca de Jaú, em que são apelantes NEW CENTER FOMENTO MERCANTIL LTDA e PIETRA INDÚSTRIA DE CALÇADOS LTDA EPP, é apelado CLAUDINA BIANCO COMERCIAL LTDA.

ACORDAM, em 20ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: "Negaram provimento ao recurso. V. U.", de conformidade com o voto do Relator, que integra este acórdão.

O julgamento teve a participação dos Exmos. Desembargadores ÁLVARO TORRES JÚNIOR (Presidente sem voto), REBELLO PINHO E ALBERTO GOSSON.

São Paulo, 18 de agosto de 2014.

Luis Carlos de Barros

RELATOR

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

Apelação nº 0007927-43.2007.8.26.0302 - Jaú 2

VOTO Nº: 25361

APEL. Nº: 0007927-43.2007.8.26.0302

COMARCA: JAU

APTE.: NEW CENTER FOMENTO MERCANTIL LTDA. E OUTRO

APDO.: CLAUDINA BIANCO COMERCIAL LTDA.

Ementa: Duplicatas. Defeito formal na emissão de natureza grave e substancial. Inviabilidade de reparação mediante o aceite lançado no titulo ou por declarações de confirmação do negócio. Recurso improvido.

A sentença de primeiro grau cujo relatório é adotado, julgou parcialmente procedente a presente ação declaratória de nulidade de titulo de crédito (duplicatas), cumulada com indenização por danos materiais.

Apelam os vencidos procurando reverter o resultado do julgamento. O recurso foi processado com as formalidades legais.

É o relatório.

Os recorrentes, empresa de factoring e empresa sacadora das duplicatas, pedem a reforma da r.sentença de primeiro grau que declarou a inexigibilidade de 10 duplicatas, sacadas pela segunda pessoa jurídica apelante e endossadas à empresa de factoring.

Os argumentos trazidos pelas recorrentes em principio impressionam: dizem os recorrentes que as duplicatas foram aceitas pela autora e que existe Nota Fiscal acompanhada do comprovante de recebimento das mercadorias.

Isto realmente é atestado pelos documentos juntados às fls. 37/48.

Defendem também os apelantes tese, no sentido de que uma vez aceitas as duplicatas, as mesmas constituem títulos de crédito, disciplinados pelo principio da abstração que informa o Direito Cambial, e assim estariam desvinculadas da causa original da obrigação.

Observe-se, por outro lado, que a autora sustenta que assinou o comprovante de recebimento de mercadoria e aceitou dez duplicatas a pedido da ré, sendo que a informação de que a transação comercial foi efetivada teve a exclusiva finalidade de propiciar à primeira requerida o “desconto” dos títulos em questão e, assim, obter numerário para produzir as mercadorias e entregá-las, posteriormente, à requerente até o vencimento do titulo. Entretanto, essa entrega não foi concretizada, não se
aperfeiçoando a transação comercial objeto do título emitido pela segunda requerida (fls. 108).

E a verdade é que a espécie em debate, tem peculiaridades próprias, que foram bem apreciadas pelo magistrado na r.sentença recorrida.

A duplicata é titulo de natureza eminentemente causal, não obstante, após o aceite, passar a ser disciplinada pelo principio da abstração, como anteriormente alientado.

Entrementes, data maxima venia, o defeito de natureza formal e originário, na emissão da duplicata, não pode ser convalidado pelo aceite lançado em seu contexto.

E este é o caso dos autos, consoante apreciado pelo magistrado, e demonstrado pela prova documental dos autos.

Ora, as duplicatas como é incontroverso teriam por base a Nota Fiscal 99754 (fls. 37), no valor de R$ 45.000,00, e pelo que consta em seu contexto seria paga em seis parcelas de R$ 2.250,00, cada uma.

Neste passo é preciso consignar a impossibilidade matemática de ser efetuado o pagamento no valor principal de R$ 45.000,00 através de seis parcelas de R$ 2.250,00, cada uma.

É claro que matematicamente seriam necessárias vinte parcelas de R$ 2.250,00 para o pagamento de R$ 45.000,00.

Daí em primeiro lugar a inviabilidade dos vencimentos estipulados na Nota Fiscal de fls. 37.

Mas o problema maior, percebido pelo Dr. Juiz de Direito, é que foram emitidas e endossadas para a empresa de factoring, duplicatas em numero superior a vinte, ou seja, em quantidade superior ao valor da Nota Fiscal de R$ 45.000,00.

Basta verificar, exemplificativamente, que a duplicata de fls. 39 tem o número 999754-93, a fls. 40 o numero 999754-97, a de fls. 41 o número 999754-98. Além disto existe a série A e a série B.Veja que a duplicata de fls. 44 tem o numero 999754-A9 e a duplicata de fls. 48 tem o número 999754-B6.

Veja que o Borderô de desconto juntado às fls. 92 referese a uma série de duplicatas no valor de R$ 2.250,00, no montante de R$ 54.000,00, ou seja, em quantia superior a Nota Fiscal de R$ 45.000,00 representativa compra e venda original.

Neste passo o magistrado asseverou em sua sentença:

“Esta claro nos autos que a fatura n. 999754 representa negócio jurídico no valor de R$ 45.000,00. Porém, observa-se que inúmeras duplicatas em séries de letras e números e em séries de números foram emitidas a partir de referida fatura no valor de R$ 2.250,00. (fls. 49, 51, 52, 54, 60, 61 e 62). Ora, tratando-se de fatura no valor de R$ 45.000,00 é óbvio, por lógica matemática e incontrastável, que somente poderia haver série de 20 duplicatas no valor de R$ 2.250,00. Nos autos, por simples leitura dos documentos está claro que houve emissão de mais de 20 duplicatas, bastando verificar pelas séries de emissão que correspondem a mais de 100 títulos (vg,
às fls. 96, verifica-se a emissão da duplicata n. 999754-1, inicio da série até a duplicata n.999754-98 (fls. 93), ou seja, pelo menos 98 títulos, assim como se segue com a emissão das duplicatas n. 999754-AO e 99754-BO, inicio das respectivas séries), tudo a indicar que foram emitidas para outra finalidade não declarada pelas partes” (fls. 268).

Na espécie a ré endossatária, empresa de factoring, não pode alegar sua condição de terceira de boa-fé. É que o defeito formal era passível de ser verificado com apenas o exame do valor na Nota Fiscal 999754 (que tem o valor de R$ 45.000,00), e o numero de duplicatas que foram descontadas com base nesta nota.

A duplicata é titulo de natureza formal que somente pode ser emitida de acordo com um fatura devidamente formalizada, e este defeito formal de gravidade substancial, não pode ser suprido pelo aceite ou por declarações de confirmação do negócio, emitidas pela autora.

Havendo vicio formal de gravidade absoluta a infirmar a validade das duplicatas, o caminho de discussão de eventual crédito existente entre as partes, somente poderá ser o das vias ordinárias.

Ante ao exposto nega-se provimento ao recurso.

LUIS CARLOS DE BARROS
Relator