TJSP - DUPLICATA VICIADA COMPRADA POR FACTORING - CONDENAÇÃO DOS EMITENTES A 3 ANOS DE DETENÇÃO

ACÓRDÃO: Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação nº 010967-45.201.8.26.0576, da Comarca de São José do Rio Preto, em que são apelantes OMISSIS e OMISSIS, é apelado MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SÃO PAULO. ACORDAM, em 1ª Câmara de Direito Criminal do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: "Deram parcial provimento ao recurso para substiuir por dez dias-multa, no piso mínimo, a sanção restritva de direito de prestação pecuniária imposta, mantida, no mais, a sentença. v.u.", de conformidade com o voto do Relator, que integra este acórdão.

O julgamento teve a participação dos Exmos. Desembargadores PÉRICLES PIZA (Presidente) e IVO DE ALMEIDA. 

São Paulo, 12 de maio de 2014. 

MÁRIO DEVIENNE FERRAZ RELATOR

Apelação nº 0010967-45.2011.8.26.0576 Comarca de São José do Rio Preto .

Apelação nº 0 10967-45.201 .8.26.0576 4ª. Vara Criminal de São José do Rio Preto. 

Apelantes: Omissis e Omissis

Apelado: Ministério Público do Estado de São Paulo

Assistente do Ministério Público: Antonio Brizoti 

Voto nº 23.585. 

1. Por sentença da MMª Juíza de Direito da 4ª Vara Criminal da Comarca de São José do Rio Preto, os réus OMISSIS e OMISSIS foram condenados como incursos nos artigos 172, “caput”, por sete vezes, c.c. 71, “caput”, ambos do Código Penal, cada qual a três anos de detenção, em regime prisional aberto, e quinze dias-multa, no piso mínimo, substituída a sanção carcerária por penas restritivas de direito, consistentes em prestação de serviços à comunidade e prestação pecuniária no valor de cinco salários mínimos, por terem, entre os meses de fevereiro a abril, emitido duplicatas simuladas em nome da empresa “Guimarães & Filho Metalúrgica Ltda-ME”, localizada na Rua Gumercindo Tomaz de Aquino, nº 60, bair o Centenário da Emancipação, naquela cidade, em desfavor das empresas “Carlos Roberto Beneduz i Aguilar-ME”, “Rocha & Filhos Metalúrgica Ltda” e “Polus Indústria e Comércio de Móveis Ltda”, embora elas não correspondes em a nenhuma transação comercial, causando prejuízo à empresa de factoring “ABM Fomento Mercantil Ltda”.

Inconformados com es a decisão os réus recor eram em busca da absolvição por terem agido em estado de necessidade. De forma alternativa, pretendem o reconhecimento da confis ão espontânea e o afastamento da pena pecuniária.

Regularmente processado o recurso, pelo improvimento opinou a douta Procuradoria de Justiça. É a síntese do necessário.

2. A materialidade delitiva está provada pelos documentos juntados às fls. 19/57. A autoria também é certa, pois como se colhe dos autos, o inquérito policial foi instaurado a partir das informações trazidas pelo representante da empresa “ABM Fomento Mercantil Limitada”, noticiando a emissão fraudulenta, em desfavor de outras empresas, de duplicatas mercantis pela empresa da qual os réus eram os gestores. Nes e sentido a representação dirigida à autoridade policial pela empresa vítima e o relato de seu representante em Juízo (fls. 2/7 e 219). Sempre que inter ogados, os réus admitiram terem emitido duplicatas referentes a negociações que só não foram realizadas porque a empresa deles estava pas ando por dificuldades financeiras (fls. 102/103, 106/107 e 220/223). Nes e diapasão os relatos dos representantes das empresas confirmando a emis ão irregular das duplicatas pelos réus, sustentando não terem recebido as mercadorias a que se referiam, fraude somente descoberta quando foram cobrados pela empresa vítima, que teria antecipado o crédito inexistente aos apelantes (fls. 70, 76/77, 88, 202, 214/215). Como se vê, a reiterada confissão dos réus se compatibil zou com as demais provas, retratando a realidade dos fatos imputados, cumprindo anotar que sobre a confis ão judicial já as entou o extinto Tribunal de Alçada Criminal deste Estado que, “Sem margem para divagações doutrinárias ou construções hermenêuticas, a confis ão judicial constitui elemento seguríssimo de convicção. Apenas especialíssima e incomum circunstância que lhe evidencie a insinceridade justifica sua recusa” (JTACRIM 93/239). Nes a análise, a alegação de que os réus teriam agido em estado de neces idade não vinga, pois ao reconhecimento de tal excludente de criminalidade exige-se prova induvidosa que demonstre ter sido a conduta determinada por razões insuperáveis,-o que não ocor eu,- sob pena de se tornar a justificativa válvula de escape para o cometimento de ilícitos penais. 

Oportuno ponderar ser a duplicata título causal, que deve ter por substrato uma efetiva venda de mercadoria ou prestação de serviço, devendo haver estrita correspondência, em quantidade e qualidade, entre a realidade fática e a emis ão do título, respondendo o agente que o emitir desrespeitando a regra de que a cada título deva cor esponder uma efetiva operação mercantil.

Evidente, portanto, a irregularidade na emis ão dos títulos de crédito em referência, nos quais os réus apuseram valores que não representavam nenhuma transação mercantil com as empresas e que foram colocados em circulação, pos ibil tando a descoberta da fraude por parte da empresa vítima que efetuou a antecipação do crédito. 

Reiteradamente tem se decidido que o crime de emissão de duplicata simulada é delito de natureza formal, que se perfaz com a colocação do título na praça sem que cor esponda à venda de mercadoria ou à prestação de serviços, independente do prejuízo (JUTACRIM 28/274, 75/454, 80/543, RT 526/392, 559/358, entre outros). A propósito, “É evidente que aquele que as ina duplicata tem o dever de verificar, previamente, se sua emis ão cor esponde a um negócio efetivo e real, pois, em caso contrário, estará as umindo o risco de resultado lesivo” (Julgados do TACrimSP 15/528). Portanto, bem demonstradas autoria e materialidade da infração de emissão de duplicatas simuladas por parte dos apelantes, as im como o dolo com que eles agiram, da condenação não podiam mesmo escapar. Cumpre observar que o fato de os réus estarem providenciando o res arcimento dos títulos não elide o crime até porque, como já anotou a jurisprudência, “O pagamento, no delito do art. 172 do CP, não tem, em princípio, relevância, visto que o crime se consuma independentemente da ocorrência de prejuízo” (Julgados do TACrimSP 75/454; no mesmo sentido: RTJ 117/964, RT 578/426, 504/357 e 595/378). As penas foram fixadas no piso mínimo, não havendo, pois, espaço para a atenuante da confis ão dos réus influir na dosimetria, incidindo na espécie a súmula nº 231 do colendo Superior Tribunal de Justiça, que dispõe: “A incidência da circunstância atenuante não pode conduzir à redução da pena abaixo do mínimo legal”. A continuidade delitiva foi cor etamente reconhecida e o acréscimo de metade se mostrou adequado, pois foram sete as infrações. De outra parte, o regime prisional aberto fixado foi o mais favorável pos ível e descabe aqui modificá-lo, mas, apesar de cor eta a substituição da pena carcerária, é bem de ver que era possível que ela se operas e por uma pena restritiva de direito e multa, nos exatos termos do artigo 44, § 2º, do Código Penal. Optando pela substituição por duas penas restritivas de direito, forma mais gravosa, a eminente juíza sentenciante deveria ter fundamentado sua escolha. Como não o fez, cabe substituir a pena restritiva de direito de prestação pecuniária por dez dias-multa, no piso mínimo. Para tal fim, pois, o provimento parcial do recurso se impõe.

3. Destarte, por meu voto, dá-se parcial provimento ao recurso para substituir por dez dias- multa, no piso mínimo, a sanção restritiva de direito de prestação pecuniária imposta, mantida, no mais, a sentença.

MÁRIO DEVIENNE FERRAZ
- Relator -