Economia

Disputa pelos desbancarizados

A s medidas de restrição devido à pandemia estimularam o comércio eletrônico e o uso de recursos digitais nas transações financeiras. Esse movimento não se restringiu aos clientes tradicionais. Ele englobou também a multidão de brasileiras e brasileiros que não possui nenhum relacionamento bancário, abrindo enormes oportunidades para quem se dedica a atender os “sem banco”. É uma fatia importante do Produto Interno Bruto (PIB). Segundo o instituto Locomotiva, há 45 milhões de brasileiros desbancarizados. Dessa multidão, 58% não frequentaram escolas e 86% pertencem às classes C, D e E. Mesmo assim, o potencial é imenso, pois esse grupo movimenta cerca de R$ 800 bilhões por ano. Não por acaso, 286 das 742 fintechs brasileiras estão de olho nesse público: 38% dessas startups se dedicam a oferecer crédito, facilitar pagamentos, orientar nas finanças pessoais e ajudar a controlar as dívidas. Tudo de forma digital, segundo um estudo da Distrito FinTech Report, um hub de startups financeiras, publicado no ano passado.

Esse movimento vai além dos grandes centros e mostra o crescimento estimulado pela pandemia. O executivo paraibano Felipe Felix criou o Will Bank em 2017 mirando pequenos comerciantes em cidades de até 100 mil habitantes, inicialmente na região Nordeste. Desde seu lançamento, a fintech já emitiu 11 milhões de cartões de crédito e débito, dos quais 1,6 milhão só no ano passado. Em 2020, o movimento foi de R$ 4,5 bilhões. Conhecedor da clientela, Felix simplificou os produtos do Will Bank. “Qualquer cidadezinha do Nordeste tem uma agência bancária, mas as pessoas não vão, pois ficam desconfortáveis com a desconfiança”, disse ele. A saída foi inverter a lógica e confiar no cliente, utilizando inteligência artificial para traçar o perfil e oferecer, inicialmente, um cartão de crédito e depois a conta digital. “Os bancos não tem muito como atender um cliente como o nosso, cujo tíquete médio gira em torno de R$ 1 mil”, disse ele. A meta é chegar a 10 milhões de clientes ativos até 2025. Para isso, a empresa vai investir R$ 80 milhões em novas.

Tecnologia também é a aposta da Jeitto, fintech dedicada a conceder crédito para um público de 23 a 38 anos. Um algorítimo avalia o perfil de cada cliente, cuja renda média é de até R$ 3 mil por mês. “Há seis anos estamos aperfeiçoando essa tecnologia porque mesmo estando fora do sistema, essas pessoas tem carências de serviços financeiros”, disse o fundador da Jeitto, Carlos Barros. Os empréstimos são solicitados para vários fins. De pagar compras e exames de saúde até fazer investimentos em educação, com valores entre R$ 35 e R$ 500. A Jeitto encerrou 2020 com 700 mil clientes ativos e projeta alcançar a marca de 2 milhões ainda este ano.

MAIS CRÉDITO Esse movimento ocorre em um momento em que a concessão de crédito só cresce, como mostram os dados de uma pesquisa da Federação Brasileira de Bancos (Febraban) realizada no final de janeiro de 2021, indicando que houve aumento de 15,4% no número de empréstimos bancários no ano passado. Só a carteira de crédito para pessoas físicas subiu 10,8%.

Empresas maiores como o PagSeguro, que está mudando seu nome para PagBank, também estão de olho nesse público. Com quase 8 milhões de clientes ativos, 5,5 milhões adicionados só em 2020, a empresa dobrou de tamanho no ano passado, apostando na inclusão de milhões de brasileiros no sistema financeiro. Com isso, ela contabilizou R$ 55 bilhões em transações financeiras no quarto trimestre. Foi um recorde trimestral e um avanço de 61% ante o mesmo período de 2019. Em breve, a disputa pelos desbancarizados deve ficar ainda mais acirrada, com a autorização pelo Banco Central do funcionamento do WhatsApp Pay, função de pagamento do aplicativo do mensagens mais popular entre os brasileiros. A liberação foi concedida pelo BC na terça-feira (30) e deve integrar a nova função ao app com mais de 120 milhões de usuários no País.
 
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