Economia

Migração para meio eletrônico eleva lucro de banco com cartão

São Paulo - O uso para a complementação de renda das famílias e de empresas e a migração do mercado brasileiro para meios eletrônicos têm elevado a receita de cartões de crédito nos cinco maiores bancos do País. Mas as altas taxas de juros e de inadimplência pedem cautela.

O volume de transações em cartão das cinco principais instituições financeiras somou, em setembro, R$ 132,884 bilhões, alta de 5% ante igual mês de 2015.

Para Vitor França, consultor e economista da Boanerges&Cia, a queda na renda do consumidor e as fracas condições de crédito para as empresas têm impulsionado o uso do plástico como uma linha emergencial.

"Sem a obrigação de pagamento imediato e com a necessidade de dinheiro no orçamento, tanto a pessoa física quanto a jurídica acabam dando uma 'pedalada' em suas próprias finanças, usando o limite do cartão para complementar o que falta e tentar reassumir o controle das contas", identifica.

Os juros e os calotes, no entanto, também acompanharam o maior apetite pelo segmento. Segundo dados do Banco Central (BC), o total de juros de cartões de créditos para pessoas físicas registrou, em setembro, uma taxa anual de 121,1%. O número é 23,9 pontos percentuais (p.p.) maior do que o observado no ano passado. Já a inadimplência da modalidade ficou em 8,2%, +0,2 p.p, na mesma base de comparação.

Para pessoas jurídicas, os juros ficaram em 112,5% ao ano, (30,2 p.p. superior do que setembro de 2015), e os calotes em 17% (+1,1 p.p. na mesma relação).

"A renda em queda é quase um desespero. O risco é grande. Mas dentro dessa situação é quase a única saída que eles [consumidores e empresas] têm", completa Vitor França.

'Mar aberto'

Quanto ao ganho dos bancos, no entanto, os especialistas ouvidos pelo DCI destacam que, maior do que a dificuldade na renda, a tendência tecnológica do segmento é uma grande alavanca das receitas.

Com exceção da Caixa, que recuou 1,77% (de R$ 6,433 bilhões em setembro de 2015 para R$ 6,319 bilhões em igual mês deste ano), todas as outras instituições tiveram altas significativas no saldo de operações com o produto.

O maior volume do terceiro trimestre foi do Bradesco, com R$ 29,167 bilhões, alta de 12,3% em relação a igual período do ano passado. O número, porém, não conta com a aquisição do HSBC, cujas negociações trouxeram mais R$ 4,302 bilhões na linha de cartões do banco brasileiro. Somado ao volume principal, a alta seria de 28,8% na mesma comparação (R$ 33,469 bilhões).

Em seguida, vieram Santander, com alta de 7,74% (de R$ 17,453 bilhões para R$ 18,804 bilhões na relação setembro contra setembro); Banco do Brasil (BB), com +6,1% (de R$ 21,537 bilhões para R$ 22,844 bilhões no período) e Itaú Unibanco, com aumento de 1,26% no volume (de R$ 55,051 bilhões para R$ 55,750 bilhões).

Para Alexandre Rappaport, diretor do Bradesco Cartões, não é somente a migração para os meios eletrônicos e o maior controle que impulsionam o plástico, mas também a soma das receitas, que reforça a atuação dos bancos no setor.

"Os cartões correspondem a 30% no consumo das famílias e têm potencial para ultrapassar os 65%. Além disso, os lucros da linha representam, hoje, 37% da receita de prestação de serviços do Bradesco. É a soma do ambiente eletrônico ao menor custo de serviço", explica.

O diretor de meios de pagamento do Banco do Brasil, Rogério Panca, porém, comenta que, mesmo com a inadimplência mais controlada, a abertura do crédito ainda é restrita.

"A substituição de pagamentos tem elevado a bancarização, e isso é um mar aberto de oportunidades, mas ainda não dá para trabalhar sem seletividade. A preocupação é com a qualidade da carteira e a palavra é 'restritividade' quando falamos em empréstimos", completa.

'Principal elemento'

Segundo relatório exclusivo feito pela Boanerges&Cia ao DCI, outro ponto de relevância sobre a receita bancária em cima dos cartões de crédito é a forte participação das instituições nas empresas de adquirência.

O destaque ficou para o BB, com crescimento de 29,5% nos negócios de adquirências (Cielo e Alelo). Em seguida aparece Santander, com alta de 29% no negócio de adquirência da Getnet, e o Itaú, com aumento de 8,1% na receita da Rede.

"A percepção é de que as principais adquirentes, reguladas pelos maiores bancos do País, estão se fundamentando em receita de serviços", avalia França. Ele completa que, com o potencial do setor, "a expectativa é de crescimento nas duas pontas", tanto na linha de crédito quanto na atividade credenciadora.

De acordo com os executivos dos bancos, o foco em rentabilidade e na atuação nas classes mais altas, porém, será o principal fator para o desempenho do sistema financeiro.

"Já estamos crescendo mais do que o guidance [9% frente ao mínimo de 7,5% projetado] e a expectativa é que esse comprometimento com rentabilidade se destaque ainda mais em 2017", afirma Panca, do BB.

"Já no quarto trimestre será possível ver um crescimento mais significativo na linha dos cartões, uma vez que a aquisição do HSBC abriu uma forte oportunidade para o banco reforçar a atuação na alta renda", diz Rappaport, do Bradesco, acrescentando que, "no passar da crise", os antigos patamares serão retomados. "Esse é o principal elemento aqui", finaliza.

Procurados pelo DCI, os bancos Santander e Caixa não responderam até o final desta edição. O Itaú, por sua vez, preferiu não se pronunciar.

Isabela Bolzani

http://www.dci.com.br/em-destaque/migracao-para-meio-eletronico-eleva-lucro-de-banco-com-cartao-id588634.html