TJTDF - DUPLICATA - PROTESTO - INOPONIBILIDADE

COMERCIAL. DUPLICATA. ENDOSSO A EMPRESA DE FACTORING. ALEGAÇÃO DE NULIDADE E DE INEXIGIBILIDADE DO TÍTULO EM FACE DE PAGAMENTO FEITO AO CREDOR ORIGINÁRIO. PROTESTO. POSSIBILIDADE. INOPONIBILIDADE DE EXCEÇÕES ATINENTES A RELAÇÃO JURIDICA BASE. DANOS MORAIS INEXISTENTES.
01. Não ostenta efeito liberatório o pagamento de duplicata efetuado diretamente ao sacado (credor originário), se o título circulou por meio de endosso e chegou às mãos de empresa de factoring.
2. A empresa que aceita título de crédito (duplicata) e que concorda efetuar o pagamento do valor devido por meio de recibo sem exigir a entrega do título de crédito original que aceitara, paga mal e assume a obrigação de pagar novamente ao portador do título, a quem se reconhece o direito de promover o protesto, em caso de inadimplência do devedor.
3. Recurso conhecido e desprovido, sentença mantida.

 

Órgão : Terceira Turma Cível
Classe : APC – Apelação Cível
Nº. do Processo : 2001.01.1.038074-0
Apelante  : FC1 Comercial de Alimentos Ltda.
Apelada  : Brasília Factoring Fomento Comercial Ltda.
Relator Des. : JOÃO BATISTA TEIXEIRA
Revisor Des.  : VASQUEZ CRUXÊN
Julg. simultâneo : APC – 2001.01.1.026833-6

ACÓRDÃO

Acordam os Desembargadores da TERCEIRA TURMA CÍVEL do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios, JOÃO BATISTA TEIXEIRA - Relator, VASQUEZ CRUXÊN - Revisor e MÁRIO-ZAM BELMIRO- Vogal, sob a presidência da Desembargadora NÍDIA CORRÊA LIMA, em CONHECER. NEGAR PROVIMENTO. UNÂNIME, de acordo com a ata do julgamento e notas taquigráficas.

Brasília-DF, 31 de outubro de 2007.

Desembargador JOÃO BATISTA TEIXEIRA
Relator

RELATÓRIO
FC1 COMERCIAL DE ALIMENTOS LTDA. ingressou com duas demandas (uma CAUTELAR DE SUSTAÇÃO DE PROTESTO – processo 2001.01.1.026833-6 e outra DECLARATÓRIA DE NULIDADE E INEXIGIBILIDADE DE TÍTULO COMBINADA COM INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS – processo 2001.01.1.038074-0) em face de BRASÍLIA FACTORING FOMENTO COMERCIAL LTDA, objetivando a nulidade e inexigibilidade do título 0018992A, no valor de R$ 3.555,32, com vencimento previsto para 04/03/2001, bem como indenização por danos morais equivalentes ao dobro do valor do título, em virtude de ter sido apontado para protesto título já pago.
O Juízo a quo, em uma única decisão, publicada no Diário de Justiça do Distrito Federal em 24/04/2007 (fls. 238 dos autos n° 2001.01.1.038074-0), julgou improcedentes os pedidos formulados pela demandante em ambas as ações (fls. 232/237 – ação principal - 2001.01.1.038074-0).
Inconformada, a autora interpôs apelação em ambos os processos (fls. 243/254  ação principal - e 201/213 ação cautelar).
Como as razões de ambos os recursos são idênticas, serão relatadas e decididas conjuntamente. Em apertada síntese, diz que a recorrida sabia do pagamento do título ao credor originário quando procedeu ao protesto, e sustenta o dever dela notificar que o título estaria sendo negociado, posto ser procuradora da credora originária, alterando o titular do crédito, conforme impõe o artigo 377 do Código Civil e contrato de fls. 101/105. Esclarece que o Juízo a quo confundiu o instituto da cessão de crédito com o cambiário, lembrando que o negócio realizado pela demandada trata-se de Convencional Factoring. Cita artigo 292 Código Civil.
Pede seja o provimento do recurso para reformar a respeitável sentença impugnada, julgando-se procedente os pedidos formulados em sede inicial.
O preparo está comprovado às fls. 214 da ação cautelar e 255 da ação principal.
Apelação no processo principal recebida no duplo efeito (fls. 257) e na cautelar somente no efeito devolutivo (fls. 216).
Convocado (fls. 259), a demandada ofertou contra-razões, pugnando pela manutenção do r. decisum (fls. 260/276).
Veio o recurso a esta relatoria por distribuição aleatória.
Determinei o encaminhamento dos autos ao eminente Desembargador Revisor, depois de relatar o feito.
É o relatório.

VOTOS
O Senhor Desembargador JOÃO BATISTA TEIXEIRA - Relator
Presentes os pressupostos que autorizam a admissibilidade da presente apelação, dela se conhece.
FC1 COMERCIAL DE ALIMENTOS LTDA. ingressou com duas demandas (uma CAUTELAR DE SUSTAÇÃO DE PROTESTO – processo 2001.01.1.026833-6 e outra DECLARATÓRIA DE NULIDADE E INEXIGIBILIDADE DE TÍTULO COMBINADA COM INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS – processo 2001.01.1.038074-0) em face de BRASÍLIA FACTORING FOMENTO COMERCIAL LTDA, ambas com o mesmo fundamento de que a duplicata que instrui os pedidos formulados foi enviada para protesto pela BRASÍLIA FACTORING FOMENTO COMERCIAL LTDA., quando já havia sido paga na data de seu vencimento à credora originária, Frigorífico Real Ltda., tornando-se, assim, inexigíveis pelo endosso, uma vez que a circulação do crédito à faturizadora não foi autorizada pelo devedor principal.
Inexistindo questões de ordem processual, prejudicial ou preliminar a serem consideradas, passa-se à análise do mérito das razões recursais.
Razão não assiste a recorrente. Se é que efetuou o pagamento do débito, o fez de forma indevida e a quem não detinha o título emitido.
Cumpre anotar que a recorrente efetivamente adquiriu mercadorias de Frigorífico Real Ltda em 12.02.1991 (fls. 55), nesta mesma data recebeu os produtos adquiridos quando carimbou e assinou o recebimento na parte destacável da primeira via da nota fiscal e, nesta mesma data, aceitou a duplicata apondo carimbo e assinatura no título, conforme se infere de fls. 56 (da ação principal).
Sustenta a recorrente que a duplicata foi endossada pelo Frigorífico Real Ltda. e negociada sem a sua anuência ou prévia ciência e levada a protesto pela endossatária, ora recorrente, mesmo após comunicada de que a obrigação havia sido paga diretamente ao sacador (credor originário). Complementa que tais fatos tornam inexigível o crédito advindo da obrigação já satisfeita e, assim, o simples apontamento do título para protesto constitui ato que afeta a sua honra a justificar indenização por danos morais.
A recorrente, em 05.03.2001, procurou o  Frigorífico Real Ltda e, salvo melhor juízo, teria efetuado o pagamento, conforme se infere do recibo de fls. 18v da ação cautelar. Parece certo e indiscutível que o recibo foi aposto no verso de uma cópia da duplicata, posto que referido documento de fls. 18, não contém a assinatura da empresa emitente e muito menos o aceite. Daí a conclusão de que a recorrente ao efetuar o pagamento discutido, se é que fez, sabia que não estava quitando o título original posto não conter o documento em questão o seu aceite e a assinatura da emitente. Assim, se tinha conhecimento de que não estava quitando o título originalmente emitido e aceito e se, mesmo assim, decidiu efetuar o pagamento, pagou mal de molde a se obrigar a pagar novamente.
Destarte, se Frigorífico Real Ltda. endossou o título aceito pela recorrente e o negociou com a recorrida e, posteriormente, veio a emitir cópia do mesmo título para receber o valor da recorrente e logrou sucesso em face da negligência da recorrente, considerando que o título circulou, o detentor da cártula tem direito de levá-la a protesto e de exigir o valor nela expressado.
Inegável que o título original (cópia às fls. 56 – ação principal) se apresenta formalmente perfeito e que circulou, tanto que a recorrida detinha a posse da cártula que apresentou para ser protestada, o que efetivamente, aconteceu. No mesmo sentido, nenhuma resistência foi manifestada pela recorrente, quando se acreditasse ser falso o título, haveria de fazer.
Neste particular, observo que após entrar em circulação por meio do endosso, adquire o título as características inerentes às cambiais, desvinculando-se do negócio que lhe deu origem, impedindo que contra o endossatário o devedor possa deduzir exceções pessoais ou relativas ao credor originário, já que dela não participou.
Trata-se, no sentir da relatoria do feito, da aplicação da inoponibilidade das exceções pessoais ao terceiro de boa fé, que afasta a alegação de que a dívida encontrava-se extinta em virtude do pagamento efetuado diretamente ao sacador, posto tratar-se de matéria restrita á relação jurídica base. Ademais, como já destacado, as mercadorias foram entregues e a duplicata aceita, restando ao comprador, isto é, à recorrente, satisfazer o crédito junto à endossatária, não se podendo reconhecer relevância a suas alegações de que não autorizou nem foi notificada da circulação do título. Não é demais complementar que a recorrente é cliente da credora originária, Frigorífico Real Ltda. e dela poderá facilmente buscar a restituição da quantia eventualmente paga, o que desde já fica ressalvado.
Convém aclarar que para comprovar o pagamento, cumpria à recorrente exibir o título que aceitou em 12.02.2001, com  recibo anotado no verso, o que não logrou fazer. Decididamente, o documento de fls. 18, da ação cautelar, como já analisado, não se presta a tanto. Trata-se, no máximo, de mero recibo cuja validade se restringe a quem pagou e a quem recebeu.
O entendimento esposado tem sido acolhido pelo nosso egrégio Tribunal de Justiça. Vejamos:

Ementa


DIREITO COMERCIAL. AÇÃO DECLARATÓRIA DE NULIDADE E INEXIGIBILIDADE DE TÍTULO C/C DANOS MORAIS. ALEGAÇÃO DA APELANTE DE QUE NÃO CELEBROU NEGÓCIO COM A APELADA QUE ENVOLVESSEM OS TÍTULOS, E QUE, OS MESMOS, FORAM PAGOS DIRETAMENTE AO SACADOR. QUE AS DUPLICATAS SÃO NULAS E INEXIGÍVEIS EM FACE DO PAGAMENTO FEITO DIRETO AO SACADOR. PROTESTO INDEVIDO. CARACTERIZAÇÃO DO DANO MORAL.
1. NÃO PRODUZ EFEITO LIBERATÓRIO O PAGAMENTO DE TÍTULO DE CRÉDITO DIRETAMENTE AO SACADOR, SE O TÍTULO FOI ENDOSSADO, ENCONTRANDO-SE NA MÃO DA CREDORA DO MESMO.
2. DESAUTORIZA INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS, O PROTESTO LEGAL DE TÍTULO DE CRÉDITO VENCIDO E NÃO QUITADO.
3. NÃO COMPROVADA A MÁ-FÉ, DÁ-SE PARCIAL PROVIMENTO AO RECURSO PARA DECOTAR A PENALIDADE APLICADA POR MÁ-FÉ. (Classe do Processo : APELAÇÃO CÍVEL 20010410026769APC DF - Registro do Acórdão Número: 172202 - Data de Julgamento: 17/02/2003 - Órgão Julgador: 2ª Turma Cível - Relator: MARIO-ZAM BELMIRO - Publicação no DJU: 28/05/2003 Pág.: 64
(até 31/12/1993 na Seção 2, a partir de 01/01/1994 na Seção 3) – Disponível em www.tjdft.gov.br, acesso em 27.09.2007).


A notificação de fls. 13/14, a toda evidência não tem o condão de afastar a exigibilidade da duplicara que foi posta em circulação por força de endosso.
Em razões recursais, a recorrente invoca a obrigação do Frigorífico e da faturizadora de lhe avisar acerca da circulação do Título. No particular, inexiste obrigação legal no sentido invocado e, eventual cláusula contratual celebrada ente a recorrida a empresa cedente do título (Frigorífico Real Ltda.) a respeito, entre elas haverão de ser resolvida, não sendo lícito à recorrente, invocar dita relação jurídica para liberar-se do compromisso comercial assumido ao aceitar a duplicata discutida nos autos.
O pleito relativo a danos morais, evidentemente, somente se apresentaria possível, se comprovada a indevida inclusão, ou postulação, acerca da inclusão do nome da recorrente no cadastro negativo dos entes de proteção ao crédito. No particular, tal fato não restou provado nos autos e, ainda que se tivesse prova da negativação, a medida estaria autorizada em face da falta de pagamento do título aceito e da comprovada entrega das mercadorias. As alegações da recorrente de que a mera providência de apontar o título para protesto já gera a obrigação de compor danos morais, não merece ser acolhida, mormente quando existe débito não pago a justificar a providência. Ademais, a recorrente não logrou comprovar qualquer fato decorrente do apontamento discutido, que pudesse ensejar o pretendido dano imaterial.
Por estes motivos, e firme na fundamentação ora alinhada, VOTO no sentido de NEGAR PROVIMENTO a ambos os RECURSOS, mantendo intacta a r. sentença desafiada.
É como voto.

O Senhor Desembargador VASQUEZ CRUXÊN - Revisor
Considerando que o meu entendimento sobre as questões postas sub judice se conduz no mesmo sentido em que exposto pela relatoria, aos seus fundamentos adiro, inclusive quanto à conclusão.
É como voto.


O Senhor Desembargador MÁRIO-ZAM BELMIRO - Vogal
Com a Turma.

DECISÃO
CONHECIDO. NEGOU-SE PROVIMENTO. UNÂNIME.

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