Economia

Linha de crédito se torna desafio para empresas

Criado na pandemia para socorrer os pequenos negócios, que tiveram que fechar as portas ou reduzir suas atividades, o Programa Nacional de Apoio às Microempresas e Empresas de Pequeno Porte (Pronampe) foi lançado em condições atraentes, com as menores taxas do mercado. Em 2020, emprestou R$ 37 bilhões a 468 mil empresas. Em 2021, os R$ 25 bilhões previstos para o ano se esgotaram em poucos meses.

Porém, o custo do financiamento disparou com a alta da Selic, recurso do qual o Banco Central tem lançado mão para tentar controlar a inflação. Assim, de uma taxa inicial de 2,25% da Selic mais 1,25% ao ano em 2020, o Pronampe passou a cobrar Selic + 6% em 2021, quando se tornou permanente. Em 2022, uma adversidade a mais: a taxa básica de juros caminha celeremente para mais de 13% e o custo da linha de empréstimo está chegando aos 20% ao ano.

“O Pronampe foi oferecido no período mais grave da pandemia. A ideia era manter o nível de empregos e evitar a falência das pequenas empresas, muitas delas sem poder funcionar”, lembra o professor Flávio Constantino, do Departamento de Economia da PUC. “Naquele momento, a inflação não era um grande problema e o Banco Central achava que os preços continuariam estáveis”, acrescenta.

Pressionados por energia, combustíveis, excesso de gastos do governo e agora o conflito na Ucrânia, os preços aumentaram, geraram inflação, e o único remédio para combatê-la é a alta dos juros, que encarece o crédito, reduz o nível de emprego e de consumo – um panorama catastrófico para as pequenas empresas e terreno fértil para a inadimplência.

O Banco do Brasil, que é administrador do Fundo de Garantia de Operações (FGO) do Pronampe, vai comunicar seus resultados nos próximos dias e é impedido de divulgar suas operações financeiras neste período. Mas, em fevereiro, a inadimplência geral das operações contratadas estava em 4,5%.

Superior à inadimplência média dos empréstimos concedidos a pessoas jurídicas, que era de 1,33% em dezembro, segundo o Banco Central. O crédito total a micro, pequenas e médias empresas tinha então inadimplência de 2,55%, e para grandes empresas o índice era de 0,39%.

Também procurada pelo DIÁRIO DO COMÉRCIO, a Caixa não informou o tamanho de suas operações na linha e afirmou, através de sua assessoria, que não divulga índices de inadimplência. Já o BDMG, também um grande operador do Pronampe, informou que ela está “em níveis aceitáveis”.

Uma pesquisa realizada pela Associação Brasileira de Bares e Restaurantes (Abrasel-MG) com empresários do setor, entre os dias 21/2 e 03/3, mostra que a situação é mais grave. Segundo ela, 67% dos empresários do setor contraíram empréstimos na pandemia, 82% por meio do programa. Outros 14% dos entrevistados já estavam com parcelas do Pronampe atrasadas, 43% deles há mais de 90 dias.

Segundo pesquisa do Sebrae e da Fundação Getulio Vargas, feita entre novembro e dezembro do ano passado (a mais recente), mais de 60% dos pequenos negócios buscaram empréstimos desde o início da crise da Covid e quase um terço do total (28%) estão inadimplentes.

BDMG

O BDMG tem tentado ajudar os segmentos mais fragilizados. Em 2021, 63% (ou R$ 197 milhões) do crédito liberado pelo banco para o segmento de micro e pequenas empresas foi por meio do Pronampe, para 3.537 clientes localizados em 351 municípios mineiros. Destes, 265 deles com IDH abaixo da média brasileira.

Em outubro de 2021, o BDMG reduziu para 5% ao ano mais Selic a taxa para micro e pequenas empresas de Minas Gerais interessadas em obter crédito por meio do Pronampe. O movimento diferenciou o banco da concorrência, uma vez que as demais instituições financeiras do mercado praticaram o limite estabelecido pelo programa, de 6% ao ano mais Selic.

Além da menor taxa de juros, o BDMG praticou outros diferenciais em relação ao restante do mercado: as empresas com participação feminina no capital social maior ou igual a 50%, há pelo menos seis meses, e as empresas da cadeia do turismo, eventos, bares e restaurantes contaram com Tarifa de Abertura e Acompanhamento de Crédito (TAAC) reduzida.

O professor Flávio Constantino aponta o fato de que, com o aumento dos juros, as pequenas empresas dificilmente poderão cumprir com o compromisso de não demitir. “Por um lado, as vendas estão fracas, ou seja, o empresário tem pouca receita para honrar o empréstimo; por outro, os encargos estão mais altos e mais difíceis de serem honrados. Ou seja, se correr, o bicho pega; se ficar, o bicho come”, compara Constantino.

Para manter seus funcionários, o pequeno negócio teria que cortar outros custos, o que é praticamente impossível em um segmento que usa pouca tecnologia e no qual a mão de obra pesa muito. “A tendência é que a inadimplência aumente nos próximos meses, já que essas empresas são mais reféns da crise econômica. Se tentarem recorrer a outras modalidades de crédito, vão encontrar taxas mais elevadas”, lamenta o economista.

Nesta semana, o Banco Central aumentou novamente a Selic, desta vez para 12,75% ao ano. Ainda assim, em termos de juros, o Pronampe continua oferecendo uma das taxas mais favoráveis do mercado, onde elas podem chegar a 30% ao ano.

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