TJSP - CHEQUE - FACTORING - DESNECESSIDADE DE DEMONSTRAÇÃO DA ORIGEM

Monitoria. Cheques prescritos. Demanda ajuizada por empresa de factoring. Determinação de emenda à inicial para se declinar a "causa debendi". Agravo de instrumento. Cheque que é título de § crédito abstrato. Circulação por endosso. Desnecessidade de demonstração da origem do cheque. Decisão reformada. Recurso acolhido por decisão monocrática.

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

DECISÃO MONOCRATICA

Agravo de Instrumento Processo n° 0049901-54.2011.8.26.0000

Relator(a): VIRGÍLIO DE OLIVEIRA JÚNIOR

Órgão Julgador: 21a Câmara de Direito Privado

DECISÃO MONOCRATICA

VOTO N.: 18549

AGRV. N.: 0049901-54.2011.8.26.0000

COMARCA: SÃO JOSÉ DO RIO PRETO

AGTE. : ABM FACTORING E FOMENTO MERCANTIL LTDA.

AGDO. : EXCLUSIVA RIO PRETO COMÉRCIO E CONFECÇÕES LTDA.ME

Monitoria. Cheques prescritos. Demanda ajuizada por empresa de factoring. Determinação de emenda à inicial para se declinar a "causa debendi". Agravo de instrumento. Cheque que é título de § crédito abstrato. Circulação por endosso. Desnecessidade de demonstração da origem do cheque. Decisão reformada. Recurso acolhido por decisão monocrática.

ABM Factoring e Fomento Mercantil Ltda., por este agravo de instrumento, se volta contra a r.decisão assim exarada:

"É certo que em se tratando de cheque prescrito, em pricípio, fica dispensada a indicação da causa subjacente. No entento, no caso, a autora da ação monitoria é empresa de falurização, de modo que o endosso assume natureza contratual e não cambial...Destarte, faculto à autora a comprovação da causa subjacente, por documentos, na forma supracitada, no prazo de 10 dias, sob pena de extinção do feito." [fls. 79/80].

O inconformismo da parte prospera. Explica-se.

Cuidam os autos principais de ação monitoria embasada em cheques prescritos. Nesse sentido, não há que se esquecer que cheque "é o título cambiário abstraio formal, resultante de mera declaração unilateral de vontade, pelo qual uma pessoa, designada emitente ou sacador, com base em prévia e disponível provisão de fundos em poder de banco ou instituição financeira a ele assemelhada por lei, denominado sacado, dá contra o banco, em decorrência de convenção expressa ou tácita, uma ordem incondicional de pagamento à vista, em seu próprio beneficio ou em favor de terceiro, intitulado tomador ou beneficiário. [cf. Luiz Emygdio F. da Rosa Jr, Títulos de Crédito, 4a Edição, Editora Renovar, 2006].

Ainda que prescrita a cártula, isso não lhe tira a abstração, não se vinculando à causa debendi.

E o que já decidiu o c. Superior Tribunal de Justiça: "1 - Ainda que o cheque esteja prescrito, não se faz necessária a demonstração da causa debendi pelo autor quando da propositura da ação monitoria. 2 - O ónus da prova da inexistência do débito cabe, pois, à ré. Precedentes do STJ. 3 - Recurso provido" [cf.TJDFT- 4a T. Cível; AC n° 2001.01.1.110979-9; Rei. Des. Humberto A. Ulhôa; j . 21/3/2005; v.u.].

O fato de ter circulado por endosso tampouco modifica essa situação, data a natureza cambiária do título.

Nem mesmo o fato de ser a autora uma empresa faturizadora modifica esse fato. A discussão da causa debendi só seria possível havendo indícios de má-fé na relação jurídica. Tese que deve ser comprovada pela parte adversa.

Nesse sentido já se posicionou esta corte:

"Embargos à execução. Cheque. Cerceamento de defesa. Inocorrência. Discussão da causa debendi. Impossibilidade no caso concreto. Recurso improvido" [cf. TJSP, 21a Câmara de Direito Privado, Apelação n° 91.09.086196-6, Rel. Des. Maurício Ferreira Leite]. I

"Cambial. Declaratória de nulidade. Cheque. Reconhecida a obrigatoriedade do protesto, a fim de viabilizar a ação de regresso contra a endossante, eis que título, que entrou em circulação por meio de endosso, não foi pago pelo sacado por falta de fundos. Hipótese em que a invalidação do título, com a consequente sustação do protesto, dependeria da demonstração de má-fé por parte da ré, não cabendo a discussão da relação jurídica subjacente, porquento ela, endossatária, estranha ao negócio determinante da emissão do cheque, não se sujeita à exceções fundadadas na causa debendi, sendo, ademais, irrelevante averiguar a regularidade de sua situação como empresa de de factoring, ação improcedente. Rel. Des. Itamar Gaino, j . 29.01.2009].Recurso improvido [cf. TJSP, 21a Câmara de Direito Privado, Apelação n°l.030.806-6,

O i.Min. do Humberto Gomes de Barros, em seu voto no REsp 820672, j . 06.03.2008, esclareceu que, "o fato do cheque ter sido objeto de operação de factoring não desnatura o valor cambial do título ou lhe diminui a autonomia e : abstração. Lembre-se que o factoring não possui regime jurídico próprio no direito pátrio. Não há delimitação jurídica dos efeitos de tal operação, que, na verdade, é feita à base de institutos jurídicos próprios. Assim, não podemos desconsiderar a eficácia duma relação cambial pelo simples fato de se ter ocorrido uma operação de factoring, que não possui qualquer efeito jurídico legal capaz de elidir a relação cambial. Na prática, em linhas muito simples, o fomento mercantil, na faceta abordada nesse caso, consiste na compra de títulos de crédito com um deságio sobre o valor de face da cártula. Essa compra acaba se perfazendo com uso de institutos jurídicos conhecidos, que possuem efeitos próprios. Vejamos algumas situações práticas: (...) O faiurizador recebe um título de crédito nominativo por endosso. Nessa situação, temos um instituto jurídico com efeitos cambiais próprios, que não podem ser afastados pela operação de factoring . Vale dizer: a eficácia da relação cambial decorrente do endosso não se abala pela operação de fomento mercantil, porque a realização de contrato entre faturizado e faturizador não afeta a eficácia do endosso passado no título de crédito. Aqui, por força da circulação do título por endosso, com maior razão só será viável a oposição de exceções pessoais que o sacador tenha contra o faturizador e não contra o beneficiário originário. Note-se que, inclusive, o faturizado pode, a depender do tipo de endosso (com ou sem garantia), excluir sua responsabilidade (LUG, Art. 15)".

Por esse enfoque, reforma-se a r.decisão combatida, para que prossiga a ação monitoria, sem que haja necessidade de demonstração da "causa debendi".

Diante do exposto, acolhe-se o recurso, por decisão monocrática, nos termos do art. 557, parágrafo 1°-A, do Código de Processo Civil. Oportunamente, encaminhem-se os autos à d.Vara de origem.

Desembargador Virgílio de Oliveira Júnior
Relator