CIVIL, COMERCIAL E PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO RETIDO. CONHECIMENTO E IMPROVIMENTO. EMBARGOS À EXECUÇÃO. ESCRITURA PÚBLICA DE CONFISSÃO DE DÍVIDA. CONTRATO DE FACTORING ANTERIOR. INOCORRÊNCIA DE VÍCIOS DE CONSENTIMENTO. LIQUIDEZ, CERTEZA E EXIGIBILIDADE. PENHORA DE BEM IMÓVEL DOS SÓCIOS DADO EM GARANTIA HIPOTECÁRIA. IMPOSSIBILIDADE. APLICABILIDADE DO BENEFÍCIO PREVISTO PELOS ARTS. 1º E 3º, V, DA LEI Nº 8.009/90. ATIVIDADE DE FOMENTO MERCANTIL. INAPLICABILIDADE DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR POR EXCESSO DE EXECUÇÃO. INEXISTÊNCIA. CONDENAÇÃO DE HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. SUCUMBÊNCIA EM PARTE MÍNIMA. APLICAÇÃO DO ART. 21 DO CPC. CONHECIMENTO E PROVIMENTO PARCIAL. PRECEDENTES. 

RECURSO ESPECIAL Nº 958.216 - RN (2007/0128482-8)
RELATOR : MINISTRO SIDNEI BENETI
RECORRENTE : LIDERANÇA FACTORING SOCIEDADE DE FOMENTO COMERCIAL LTDA
ADVOGADO : ÂNGELO AUGUSTO COSTA DELGADO
RECORRIDO  : ANTUNES E ANTUNES LTDA
ADVOGADO : JOSÉ ALEXANDRE SOBRINHO

DECISÃO

1.- LIDERANÇA FACTORING SOCIEDADE DE FOMENTO COMERCIAL LTDA. interpõe recurso especial com fundamento nas alíneas "a" e "c" do inciso III do artigo 105 da Constituição Federal, contra Acórdão proferido pelo Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Norte, Relator para Acórdão o Desembargador JOÃO REBOUÇAS, cuja ementa ora se transcreve (fls. 333):

CIVIL, COMERCIAL E PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO RETIDO. CONHECIMENTO E IMPROVIMENTO. EMBARGOS À EXECUÇÃO. ESCRITURA PÚBLICA DE CONFISSÃO DE DÍVIDA. CONTRATO DE FACTORING ANTERIOR. INOCORRÊNCIA DE VÍCIOS DE CONSENTIMENTO. LIQUIDEZ, CERTEZA E EXIGIBILIDADE. PENHORA DE BEM IMÓVEL DOS SÓCIOS DADO EM GARANTIA HIPOTECÁRIA. IMPOSSIBILIDADE. APLICABILIDADE DO BENEFÍCIO PREVISTO PELOS ARTS. 1º E 3º, V, DA LEI Nº 8.009/90. ATIVIDADE DE FOMENTO MERCANTIL. INAPLICABILIDADE DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR POR EXCESSO DE EXECUÇÃO. INEXISTÊNCIA. CONDENAÇÃO DE HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. SUCUMBÊNCIA EM PARTE MÍNIMA. APLICAÇÃO DO ART. 21 DO CPC. CONHECIMENTO E PROVIMENTO PARCIAL. PRECEDENTES.

2.- Os embargos infringentes que se seguiram (fls. 345/371) foram rejeitados em Acórdão com a seguinte ementa (fls. 395/396):

PROCESSO CIVIL. EMBARGOS INFRINGENTES. ACÓRDÃO DA TERCEIRA CÂMARA CÍVEL QUE, POR MAIORIA, RECONHECEU A IMPENHORABILIDADE DE BEM DE FAMÍLIA DE PROPRIEDADE DE SÓCIO DA EMPRESA, DADO EM GARANTIA REAL DE DÍVIDA POR ESTA CONTRAÍDA. PRELIMINAR DE NÃO CONHECIMENTO PARCIAL SUSCITADA PELOS EMBARGADOS REJEITADA. QUESTÃO DE ORDEM PÚBLICA ARGUÍDA PELA EMBARGANTE DESACOLHIDA: POSSIBILIDADE DE DISCUSSÃO DE IMPENHORABILIDADE LEGAL TANTO NOS EMBARGOS DO DEVEDOR, QUANTO PELA VIA INCIDENTAL NO PROCESSO EXECUTIVO. MÉRITO: LEI 8.009/90. ARTIGO 3º, INCISO V. INTERPRETAÇÃO RESTRITIVA. NORMA DE ORDEM PÚBLICA. REJEIÇÃO DOS EMBARGOS.
I - O artigo 3º, inciso V, da Lei 8.009/90 deve ser interpretado restritivamente, incidindo somente nas hipóteses em que a entidade familiar é devedora e beneficiária direta.
II - A dívida foi contraída pela empresa, ente personalizado, que não se confunde com a pessoa de seus sócios, possuindo autonomia patrimonial. Não há, destarte, incidência do dispositivo citado, sendo o bem hipotecado impenhorável.
III - Inexiste possibilidade de renúncia à proteção legal da impenhorabilidade do bem de família, haja vista ser norma de ordem pública, portanto indisponível.

3.- A recorrente alega, em síntese, que o imóvel particular de sócio de empresa não goza da proteção dada ao bem de família quando oferecido, pelo casal, em garantia real de dívida contraída pela empresa. O Tribunal de origem, ao entender pela impenhorabilidade do imóvel no caso concreto, teria violado o artigo 3º, V, da lei nº 8.009/90. Acrescenta que tal conclusão ainda mais se impõe porque não há prova de que ele seja habitado pelos recorridos.

4.- Aponta dissídio jurisprudencial, colacionando precedentes inclusive deste Tribunal.

É o relatório.

5.- O tema já está pacificado pela jurisprudência firmada nesta Corte, de modo que o recurso deve ser julgado monocraticamente pelo Relator, segundo orientação firmada, com fundamento no art. 557 do CPC, desnecessário,  portanto, o envio às sobrecarregadas pautas de julgamento deste Tribunal.

6.- O entendimento perfilhado pelo Tribunal apresenta-se de acordo com o que já decidido pelas turmas que compõe a Segunda Seção desta Corte, no sentido de que o imóvel oferecido pelo casal em garantia de dívida apenas se enquadra na exceção do artigo 3º, V, da Lei 8.009/90 quando essa dívida tenha sido contraída em prol da entidade familiar. Nesse sentido:

AGRAVO REGIMENTAL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. IMPENHORABILIDADE DE BEM DE FAMÍLIA. ART. 3º, V, da Lei 8.009/90. BEM DOS SÓCIOS DE EMPRESA. HIPOTECA DE CONTRATO DA EMPRESA. BENEFICIÁRIOS PRÓPRIOS. NÃO CONFIGURAÇÃO.
1.  Acerca do art. 3º, V, da Lei 8.009/90, esta Corte tem entendido que ele se aplica aos casos em que os devedores constituídores da hipoteca deram o bem como garantia da própria dívida, constituindo-se nos próprios beneficiários.
2. Não se pode presumir que o mútuo tenha sido concedido em benefício da família.
(AgRg no Ag 1126623/SP, Rel. Ministro PAULO DE TARSO SANSEVERINO, TERCEIRA TURMA, DJe 06/10/2010);

AGRAVO REGIMENTAL. BEM DE FAMÍLIA. IMÓVEL DE SÓCIO DADO EM GARANTIA HIPOTECÁRIA DA EMPRESA. IMPENHORABILIDADE.
1. É impenhorável bem de família de propriedade de sócio dado em garantia de contrato celebrado por pessoa jurídica, porquanto a exceção consignada no art. 3º, inciso V, da Lei n. 8.009/90 somente se aplica se o imóvel foi oferecido como garantia real em benefício da entidade familiar.
(PET no AgRg no Ag 1010739/MG, Rel. Ministro JOÃO OTÁVIO DE NORONHA, QUARTA TURMA, DJe 17/05/2010);

DIREITO PROCESSUAL CIVIL. BEM DE FAMÍLIA DO SÓCIO DA PESSOA JURÍDICA EXECUTADA. PENHORA. JUÍZO DEPRECADO. GARANTIA DE PESSOA JURÍDICA DADA POR TERCEIRO NÃO DEVEDOR. PEDIDO DE DESCONSTITUIÇÃO. COMPETÊNCIA DO JUÍZO DEPRECADO.
I - É impenhorável bem de família de sócio, mesmo quando o imóvel é dado em garantia de empréstimo concedido à pessoa jurídica, situação sobre a qual não incide a regra do art. 3º, V, da Lei 8.009/90.
(AgRg no REsp 1116207/RS, Rel. Ministro SIDNEI BENETI, TERCEIRA TURMA, julgado em 20/04/2010, DJe 07/05/2010);

CIVIL. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO RECEBIDOS COMO AGRAVO REGIMENTAL. PROCESSUAL CIVIL. EXECUÇÃO MOVIDA CONTRA PESSOA JURÍDICA. IMÓVEL DE SÓCIO DADO EM GARANTIA HIPOTECÁRIA DA EMPRESA. IMPENHORABILIDADE. LEI N. 8.009/90, ART. 3º, V. EXEGESE.
I. Ainda que dado em garantia de empréstimo concedido a pessoa jurídica, é impenhorável o imóvel de sócio se ele constitui bem de família, porquanto a regra protetiva, de ordem pública, aliada à personalidade jurídica própria da empresa, não admite presumir que o mútuo tenha sido concedido em benefício da pessoa física, situação diversa da hipoteca prevista na exceção consignada no inciso V, do art. 3º, da Lei n. 8.009/90.
(AgRg no REsp 1026182/MT, Rel. Ministro ALDIR PASSARINHO JUNIOR, QUARTA TURMA, DJe 31/08/2009).

7.- Ante o exposto, nega-se seguimento ao Recurso Especial.
Intimem-se.
Brasília, 18 de novembro de 2010.
Ministro SIDNEI BENETI
Relator
(Ministro SIDNEI BENETI, 23/11/2010)