Economia

Bancos voltam a olhar debêntures no secundário

Banco do Brasil, Bradesco e Santander sinalizaram a possibilidade de atuar na ponta compradora de debêntures no mercado secundário, segundo disseram ontem alguns gestores de crédito privado. Até então, o único banco que vinha participando das negociações era o Itaú. A sinalização dos outros bancos, ainda que tímida, veio dois dias depois de o Banco Central anunciar uma linha para financiar essas operações, diante da falta de liquidez nesse segmento. Procurados, Itaú, Bradesco, BB e Santander não comentaram.

Desde o fim da semana passada, os fundos de crédito estão sofrendo resgates e com dificuldades de negociar papéis para fazer caixa e honrar os pagamentos. As incertezas para a economia geradas pela crise do coronavírus travaram os negócios e distorceram preços. Quando saem, os negócios são fechados a preços fora da realidade das empresas que emitiram o crédito. Papéis de companhias com rating ‘AAA’, emitidos a CDI mais 1%, estão encontrando comprador a CDI mais 3% ou 4%, condizente com um nível de risco muito maior de crédito, por exemplo.

Para tentar proporcionar mais liquidez e racionalidade ao mercado, o BC anunciou uma linha de R$ 91 bilhões para que os bancos comprem esses papéis. No entanto, como esse empréstimo foi atrelado a um percentual do compulsório, excluiu dos bancos médios a possibilidade de acessá-la. A linha ficou limitada aos cinco maiores bancos, dois deles públicos, Caixa e Banco do Brasil, que costumam tomar decisões com mais lentidão.

Ainda assim, mesmo os privados ficaram reticentes em comprometer compulsório em uma operação de mercado de capitais. Somente o Itaú vinha dando algum socorro a esses gestores, oferecendo liquidez aos fundos, antes da medida do BC. Na manhã de ontem, apurou o Valor, BB, Bradesco e Santander ligaram para algumas gestoras pedindo a lista de ativos disponíveis para negociação e ficaram de retornar colocando preços para a compra. Até o dia anterior, de acordo com as fontes, o que esses bancos vinham dizendo é que, nesse momento mais agudo da crise, a prioridade era focar o mercado primário, em operações para clientes.

A falta de liquidez nesse segmento se transformou num problema ainda maior para a indústria de fundos de crédito porque muitos deles oferecem a possibilidade de resgate praticamente diário aos cotistas. O segmento cresceu assim, apesar de as debêntures serem um investimento de longo prazo e de esse ser um mercado ainda com um secundário em formação - antes as operações eram encarteiradas pelos bancos ou BNDES.

Nesse momento de crise, os bancos não têm nenhuma obrigação de dar liquidez, mas deverão fazer isso em alguma medida para a preservação da indústria.

Além disso, nos preços que estão e diante da necessidade de alguns fundos de fazer caixa, há oportunidades de comprar no secundário papéis de empresas com baixo risco de crédito e pagando prêmios altos. Esse quadro havia gerado a expectativa em alguns gestores de que, após a linha do BC, pudesse haver uma competição entre os bancos pelos papéis, o que levaria, inclusive, as taxas para níveis mais próximos da realidade.

Até o momento isso não aconteceu e poucos esperam que aconteça. Por essa razão, a demanda do mercado segue sendo a de solicitar ao BC que desvincule a linha do percentual do compulsório. Isso traria para o mercado os bancos médios, que teriam a possibilidade de comprar esses papéis, de empresas maiores, aos quais normalmente não têm acesso. De acordo com uma fonte, entre os bancos menores, hoje, apenas o C6 tem ajudado na liquidez dos fundos, mas por meio da recompra de letras financeiras, cujo limite foi ampliado pelo BC na segunda-feira. Outros bancos menores não têm adotado a medida para preservar caixa. O C6 não comentou.

Alguns especialistas de mercado chegaram a questionar fato de o BC dar funding barato para os grandes bancos comprarem papéis a preços distorcidos, sugerindo que o BC deveria colocar um spread máximo entre o custo da linha e o papel. Essas fontes avaliam que a melhor solução seria a entrada do BNDES no secundário, pois ele teria condições de estabilizar os negócios comprando pouco.

https://www.sinfacsp.com.br/noticia/bancos-voltam-a-olhar-debentures-no-secundario-valor-economico