Jurídico

Fazenda condena Bradesco por falha em fundo, mas reduz multa em R$ 1 milhão

O Conselho de Recursos do Sistema Financeiro Nacional (CRSFN), órgão do Ministério da Fazenda, negou recurso e manteve multa de R$ 500 mil aplicada ao Banco Bradesco por não manter atualizada documentação relativa a um fundo de investimento.

Outras duas condenações, por permitir a liquidação de direitos creditórios de forma irregular e delegar a guarda desses a entes não autorizados pela regulação, foram revertidas pelo CRSFN, livrando o banco de R$ 1 milhão em multa.

Em 2015, o colegiado da Comissão de Valores Mobiliários (CVM) condenou a instituição financeira a pagar R$ 1,5 milhão, na qualidade de custodiante do Fundo de Investimentos em Direitos Creditórios (FIDC) Union. Essa modalidade de fundo aplica recursos comprando créditos que empresas têm a receber.

O FIDC Union foi considerado um caso de fraude no mercado brasileiro. Em 2010, estimou-se que os investidores do fundo teriam levado um calote de R$ 800 milhões. Isso porque quase 75% dos créditos que o fundo teria para receber estariam vencidos.

Ao julgar o caso envolvendo o Bradesco, o então diretor-relator, Roberto Tadeu, concordou com a Superintendência de Relações com Investidores Institucionais (SIN) da CVM, entendendo que o banco cometeu irregularidades ao delegar a outros a competência para guarda dos documentos referentes aos créditos comprados pelo fundo.

Além disso, na avaliação do relator, a instituição financeira falhou ao não ter exercido “nenhum tipo de controle e nem diligenciar para manter em perfeita ordem e atualizada a documentação relativa aos direitos creditórios”.

Com relação à liquidação dos créditos, Tadeu avaliou em 2015 que cabe ao “custodiante [Bradesco] realizar a liquidação física e financeira dos direitos creditórios”. Como isso não aconteceu, segundo o diretor, a instituição feriu a ICVM 356/01.

Recurso

Com a condenação na CVM, o banco recorreu ao CRSFN, segunda e última instância do âmbito administrativo. Em sua defesa, o Bradesco argumentou, em suma, que a autarquia reguladora do mercado de capitais “cometeu vício de ilegalidade ao ampliar o conceito de custódia”.

Para o banco, na condição de custodiante não tinha responsabilidade de fiscalizar os demais serviços prestados ao fundo, “o que é atribuição do administrador”. O representante legal da instituição financeira foi o advogado José Eduardo Carneiro Queiroz, sócio-diretor do Mattos Filho.

No CRSFN, o conselheiro-relator Carlos Portugal Gouvêa, representante do Anbima no órgão, reduziu a multa aplicada ao Bradesco, dando provimento a dois dos três recursos interpostos pelo banco após a decisão da CVM.

O relator avaliou que a CVM exagerou em seu entendimento ao condenar o banco. Para ele, não caberia ao Bradesco, na função de custodiante, impedir liquidação de direitos creditórios do fundo geridos por um terceiro.

“O estabelecimento com clareza das funções do administrador e dos prestadores de serviço do fundo é um passo importante no sentido de reforçar um elemento relevante para a governança de fundos de investimento no mercado brasileiro (…) O que fez a CVM foi imputar ao custodiante a obrigação de realizar uma interpretação teleológica”, votou Gouvêa.

Em sua visão, a CVM deve adaptar sua regulação para definir especificamente qual a função de cada agente dentro da indústria de fundos de investimento.

“Caso as responsabilidades de cada um desses agentes não sejam bem especificadas, ou pior, exista uma tentativa de expandir a interpretação da regulamentação para dividi-las, o que teremos é um processo de diluição de riscos e responsabilidades, o que é campo fértil para fraudes”, afirmou o relator em seu voto.

Se isso não acontecer, Carlos Portugal Gouvêa avalia que caso a CVM adote “interpretações extensivas” com relação à responsabilidade dos prestadores de serviços para fundos de investimentos, o mercado brasileiro pode seguir o mesmo caminho que o mercado americano, que quebrou em 2008.

Segundo o conselheiro, “se todos acham que podem transferir a responsabilidade para outros agentes e não há clareza sobre a responsabilidade de cada participante do mercado, ninguém assume nenhuma responsabilidade e ninguém faz a devida análise dos riscos envolvidos”.

Já com relação a não deixar os documentos em ordem, o relator rejeitou o recurso do Bradesco. Segundo ele, “assumindo a posição de custodiante, cabe a tal agente zelar pela adequação da documentação que funda os direitos creditórios”. Com isso, a multa de R$ 500 mil foi mantida.

Em nota, o Bradesco informou que “não comenta assuntos que estão em andamento na Justiça”.

KPMG

Em maio deste ano, o CRSFN manteve multa aplicada à KPMG por falha na auditoria do fundo. O processo é relacionado ao mesmo caso do Bradesco.

https://www.jota.info/tributos-e-empresas/mercado/fazenda-condena-bradesco-fundo-18072018