Economia

Ausência de linhas específicas limitará crédito direcionado


 
Mesmo com a melhora dos indicadores, os principais setores da economia terão dificuldades no acesso ao crédito neste ano. Com escassez de linhas específicas, restrição bancária e juro alto, mercado de capitais será principal opção para captação de recursos.

Os últimos dados do Banco Central (BC) apontam que o total de concessões de recursos direcionados no ano passado ficou em R$ 17,497 bilhões. O número corresponde a uma queda de 13,4% em relação ao observado no ano anterior (R$ 20,219 bilhões) e é 39,6% menor do que o valor observado em 2015 (R$ 28,990 bilhões).

“O crédito direcionado depende de duas coisas: disponibilidade de linhas e a relação oferta e demanda”, explica o economista-chefe da Associação Nacional das Instituições de Crédito, Financiamento e Investimento (Acrefi) Nicola Tingas e pondera que ambas ainda mostram dificuldades.

“A primeira teve uma retração muito forte nos últimos anos impulsionada principalmente pelo BNDES [Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social] e a segunda ainda está desproporcional”, afirma.

As concessões do banco de fomento totalizaram R$ 8,432 bilhões no ano passado, valor 11,1% menor do que o registrado em 2016 (R$ 9,492 bilhões) e 49,3% inferior ao observado em 2015 (R$ 16,634 bilhões).

O movimento acontece, inclusive, dentre setores que demonstraram bom desempenho na crise, como o agronegócio. O crédito rural atingiu R$ 7,022 bilhões em 2017, recuo de 0,2% ante os R$ 7,181 bilhões de 2016.

De acordo com a assessora técnica da comissão nacional de política agrícola da Confederação da Agricultura e Pecuária (CNA), Fernanda Schwantes, com os empréstimos da safra 2017/2018 já estabelecidos, a expectativa para o ano agrícola 2018/2019 – que começa em julho – ainda é de dificuldade no acesso ao crédito.

“O que foi disponibilizado pelas instituições financeiras está praticamente estável, mas o montante já não é suficiente para cobrir os custos de produção. Isso ainda é uma tendência para este ano”, avalia a executiva.

Em comércio e serviços, por sua vez, a falta de linhas específicas somadas à menor exposição dos bancos no segmento corporativo também deve ter impactos negativos, principalmente para micro e pequenas empresas.

Para o assessor econômico da Federação do Comércio do Estado de São Paulo (FecomercioSP) Fabio Pina, mesmo que a recuperação da atividade econômica traga riscos menores de inadimplência e possíveis reduções de juros, o endividamento nos pequenos negócios ainda é grande.

“A demanda é sempre maior do que a oferta e a dificuldade em gerir dívidas dessas companhias atrapalha a capacidade de apresentar garantias. Veremos, sim, um desempenho melhor do crédito em 2018, mas para as empresas de pequeno porte, as condições, mesmo melhores, ainda serão ruins”, comenta Pina.

Com a melhora do consumo e o baixo patamar da taxa básica de juros (Selic), porém, ele calcula que maiores demandas devem vir de segmentos específicos, como o setor imobiliário e o de bens duráveis, no próprio varejo.

Segundo o BC, os financiamentos para imóveis registraram queda de 23,3%, saindo de R$ 1,264 bilhão em 2016 para R$ 969 milhões em 2017.

Já a modalidade “outros”, que abrange operações não passíveis de classificação pela autoridade monetária – e que corresponde pelas demais demandas de recursos direcionados – caiu 62% na mesma relação, de R$ 2,282 bilhões para R$ 1,073 bilhão.

Assim, segundo o gerente executivo de política econômica da Confederação Nacional da Indústria (CNI), Flávio Castelo Branco, mesmo que o problema conjuntural do País tenha sido “em parte, superado”, as dificuldades estruturais do mercado de crédito precisam de atenção.

“Muitas empresas sofreram com o crédito escasso e a deterioração financeira interna. Já vemos alguma melhora acontecendo, mas a inexistência de linhas de financiamento e o alto custo do capital ainda são um problema para a grande maioria das empresas”, completa.

Alternativas

Da outra ponta, os especialistas consultados pelo DCI refletem na necessidade de alternativas para a captação de recursos por parte das empresas.

“Na parte de agronegócio, trabalhamos com as autoridades responsáveis para melhorar a regulamentação dos títulos do agronegócio”, diz Schwantes, reiterando que o setor precisa de um “planejamento de médio e longo prazo” para “trazer maior garantia aos produtos”.

Já para Castelo Branco, da CNI, o mercado de capitais do País ainda é “muito incipiente” e o mercado já trabalha para criar novas opções.

“Mesmo com prazos e custos mais adequados, os títulos privados ainda têm dificuldade do ponto de vista de legislação, tributação e até em relação ao mercado secundário”, afirma o especialista, destacando que os pequenos negócios, por exemplo, continuariam sem dinheiro, já que têm acesso restrito ao mercado de capitais.

“Uma alternativa, por exemplo, seria o próprio BNDES lançar títulos e captar recursos para abrir novas linhas de financiamento para essas empresas. É uma boa opção e nós já estamos discutindo a possibilidade de isso acontecer.”

https://www.dci.com.br/impresso/ausencia-de-linhas-especificas-limitara-credito-direcionado-1.685482