Economia

Presidente do Bradesco diz que é preciso corrigir assimetrias no mercado de cartões de crédito

DAVOS - Uma das prioridades na agenda do Banco Central (BC) – a redução do spread bancário (diferença entre o que os bancos cobram dos clientes e quanto eles pagam para captar recursos no mercado) – vai ser discutida com representantes das instituições financeiras em fevereiro. Em entrevista ao GLOBO durante o Fórum Econômico Mundial de Davos, na Suíça, o presidente do Bradesco, Luiz Carlos Trabuco, disse que foi convidado para um seminário organizado pelo BC sobre spread, que também contará com a presença dos ex-presidentes da autoridade monetária Gustavo Loyola e Armínio Fraga. Segundo Trabuco, os bancos têm total disposição em tratar do assunto, que não sairá da pauta.

Outra questão que será debatida, segundo o comandante do Bradesco, é a redução das taxas de juros cobrados dos clientes de cartões de crédito. A medida fez parte do pacote de incentivo ao PIB anunciado pela equipe econômica no final do ano passado. Segundo Trabuco, uma das razões para que as taxas dos cartões no rotativo sejam tão elevadas, quase chegando a 500% ao ano, é que a maior parte do crédito concedido por meio dos cartões é parcelada e sem juros. Isso faz com que as taxas do rotativo sejam muito elevadas para compensar os riscos de inadimplência. Isso tem que ser revisto, diz Trabuco:

— O sistema de cartão de crédito é extremamente assimétrico no Brasil. O maior volume é o parcelado sem juros, que substituiu o cheque pré-datado do comércio e convive com o parcelado com juros e o rotativo. Eu acho que essa estrutura tem que sofrer um reposicionamento. Não dá para conviver. A taxa do rotativo é uma taxa que reflete o risco da operação do crédito não performado — disse ele, acrescentando:

— Temos que caminhar para um processo em que o parcelado sem juros não seja tão grande quanto é. Ele é quase 80% do montante de crédito do cartão de crédito. Existe um subsídio entre as linhas que é muito forte. O sistema ficou assimétrico.

O governo já negociou com o setor financeiro um acordo pelo qual os clientes que atrasarem o pagamento das faturas por mais de um mês deixarão de ser enquadrados na modalidade de crédito rotativo para ingressar na modalidade de parcelamento. Isso significa que, com um mês de atraso, o cliente pagará as taxas do rotativo. No entanto, se não conseguir fazer o acerto a partir do segundo mês, ele passará a pagar as taxas de parcelamento, que também são altas, mas menores que as do rotativo.

NOVO CÁLCULO DA TJLP
O presidente do Bradesco também elogiou a decisão do governo de mudar o cálculo da TJLP (Taxa de Juros de Longo Prazo) de forma que ela fique mais próxima das taxas cobradas no mercado. Hoje, a TJLP é definida pelo Conselho Monetário Nacional (CMN) e serve como referência para empréstimos do BNDES ao setor produtivo. O problema é que ela é subsidiada — está em 7,5% ao ano, enquanto a taxa básica de juros da economia (Selic) está em 13% ao ano —, e, hoje, o crédito subsidiado é muito elevado no Brasil. Assim, quando o Banco Central (BC) altera a Selic para administrar a inflação, a medida não consegue ter efeito sobre todo o crédito em circulação. Ao alinhar a TJLP às taxas de mercado, o governo aumenta o poder de fogo do BC.

De acordo com integrantes da área econômica, uma das ideias é que a TJLP passe a variar de acordo com as NTN-Bs de cinco anos. Esses papéis de longo prazo, emitidos pelo Tesouro Nacional, são corrigidos por inflação e juros. Essa mudança não ocorreria de uma só vez. Haveria um processo de transição de cerca de dez anos, respeitando contratos que já estão em vigor.

— A TJLP tem que ficar mais próxima do custo do Tesouro. Se ela ficar muito abaixo, ela tem subsídio e ele não é neutro. A Maria Silvia Bastos (presidente do BNDES) está com uma pauta adequada. Está desenhando um BNDES mais equilibrado.

Trabuco, que está em Davos pela quinta vez, diz que sempre observa interesse dos investidores em relação ao Brasil. No entanto, ele ressalta uma diferença no Fórum deste ano em relação a períodos anteriores - a forma como a equipe econômica se apresenta:

— Todos os anos tem um ingrediente de esperança em relação ao Brasil. Nos cinco anos que eu venho aqui, este é o primeiro em que existe convergência entre política fiscal e política monetária. O ministro da Fazenda e o presidente do Banco Central estão remando na mesma direção. Isso nunca aconteceu — disse ele, acrescentando:

— Tem certos momentos do passado você tinha uma política monetária severa e o crédito direcionado com as taxas subsidiadas onerando o Tesouro. É o mesmo que você administrar u m medicamento com álcool.

Segundo o executivo, seria interessante que o presidente Michel Temer voltasse a Davos no próximo ano, pois já será possível mostrar um cenário mais favorável na economia brasileira. Trabuco disse que 2017 será dois anos em um. O primeiro semestre ainda terá um rescaldo da recessão de 2016, além da renegociação das dívidas de estados com a União e o início do debate das reformas da Previdência e Trabalhista. Já o segundo terá outro humor, com retomada da atividade e mais otimismo dos investidores:

— No primeiro semestre ainda tem o rescaldo recessão, as reformas e a conclusão da renegociação das dívidas dos estados. O segundo semestre é outro ano, outro humor. A capacidade ociosa da economia está num nível tão baixo que a retomada está contratada.

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