Economia

Atual cenário de crédito vai na contramão da retomada econômica do País

São Paulo - O cenário de crédito "contradiz" a retomada da economia, na avaliação de especialistas. A queda nas concessões para empresas, somada à fraca demanda, oferta restritiva e alta inadimplência, elevam o risco e "deixam o sistema financeiro à mercê da própria carteira".

Segundo dados divulgados ontem pelo Banco Central (BC) as concessões para pessoa física em outubro recuaram 8,8% com relação a setembro (de R$ 122,7 bilhões para R$ 111,9 bilhões) e 12,8% frente igual mês de 2015 (R$ 137,9 bilhões).

De acordo com Maurício Godói, economista da Saint Paul Escola de Negócios, o grande problema é a situação inviável de recuperação das empresas do País.

"O cenário de crédito está contraditório à retomada da economia. São as companhias que fornecem toda a renda e o giro para essa recuperação e, como um dos grandes termômetros do mercado, a sinalização é de uma retração acumulada ainda mais forte", avalia.

Para Fabio Pina, conselheiro econômico da Federação do Comércio do Estado de São Paulo (FecomercioSP), no entanto, a restrição vem como um momento de espera dos bancos "para os resultados dessa seleção natural".

"Há um momento de ajuste muito forte [no mercado], no qual há uma dependência das empresas por crédito para investirem e reaquecerem a economia. Mas a alta taxa de inadimplência impede que os bancos emprestem", identifica Pina. Ele comenta, no entanto, que enxerga perspectiva mais positiva para o ano que vem.

"Quem fez a travessia deste ano pode até ter condições de ultrapassar 2017, mas não sem sufoco. Seguir em frente será difícil", afirma o conselheiro.

Ainda conforme dados do BC, apesar de estável na comparação mensal e trimestral, a inadimplência é alta, com 3,6% para pessoas jurídicas (+0,3 ponto percentual) e em 4,2% para físicas (estável).

"A inadimplência não arrefece. E ante a negação das instituições em conceder crédito para pessoas jurídicas começarem a investir e contratar, o consumo continua estagnado, o desemprego não diminui e isso acaba, como um ciclo, afetando o crédito livre ao consumidor", complementa Godói.

Foco na carteira

Com esse cenário, no entanto, os esforços dos bancos dentro das próprias carteiras de clientes tendem a aumentar.

Ainda segundo o BC, apesar da alta de 0,3 p.p. na taxa de juros de outubro ante setembro (de 33% para 33,3%), os prazos das concessões recuaram 6,6% na mesma relação (de 122,2 para 115,6 meses).

Segundo os especialistas ouvidos pelo DCI, tais números indicam um reflexo maior apenas para quem já tem empréstimos na conta.

"A dinâmica pode parecer de querer aumentar a carteira, mas os indicadores ainda não compartilham da melhora na confiança" opina Marcelo Monteiro, especialista em recuperação de crédito e diretor de novos negócios da PH3A.

"Essas alterações podem ter impactos em prestações ou renegociações de dívida, mas mostram mais o quanto os bancos tentam atuar na própria carteira do que uma mudança futura na economia", completa o executivo.

Em termos sazonais, os bancos também tentam aproveitar o maior apetite ao consumo de final de ano, inclusive ofertando produtos financeiros durante a black friday.

"Isso, porém, é um teste institucional. É colocar regras ainda restritivas para tentar descobrir quais perfis de consumidores de baixo risco ainda têm espaço de atração para esse mercado", disse Pina.

"O final de ano terá, sim, mais movimento, mas olhando na perspectiva geral, ainda há muita indefinição em Brasília para essas instituições arregaçarem as mangas e voltarem a trabalhar plenamente", completa Monteiro, da PH3A.

À espera do ajuste

Quanto à perspectiva para 2016, no entanto, os especialistas reforçam que o mercado desaquecido abre espaço para uma redução mais firme da Selic. "O BC deve retrair a taxa básica de juros ainda este ano, seja para voltar a alavancar ou para reduzir a desalavancagem do setor", avalia Pina.

Segundo Godói, no entanto, a queda na Selic ainda será insuficiente. "Não reduzirá o spread bancário e não ditará os juros de crédito. Ela será, no entanto, o efeito do ajuste fiscal e o resumo é que, agora, tomador e credor esperam pela aprovação dos pacotes para ter no que se apoiar daqui pra frente", conclui o economista.

 Isabela Bolzani

http://www.dci.com.br/financas/atual-cenario-de-credito-vai-na-contramao-da-retomada-economica-do-pais-id589823.html